Foto / Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Em 1948, quando o poema “A Flauta Que Me Roubaram” foi publicado, Cassiano Ricardo Leite, o filho mais ilustre de São José dos Campos, visitava anonimamente sua cidade de origem. Um lugar então que abrigava legiões de tuberculosos na esperança de se curar e o poeta, ensaísta e um dos mais importantes jornalistas do século 20, ansiava voltar ao seu passado de menino e de lembranças desse período. Mesmo diante de tantos ensaios e promessas, isso nunca aconteceu.

Este ano também detém a efeméride dos 50 anos de morte de Cassiano, que até o momento passa em branco, seja por ignorância, por desleixo, por negligência, ou notadamente por desconhecimento deste ilustre cada vez mais desconhecido.

São José dos Campos, nesta data de 26 de julho de 2024, precisa comemorar os 130 anos de nascimento de um dos maiores poetas da língua portuguesa e dos mais importantes do grupo da Semana de 22.

Como precisa promover seu pleno resgate, que passa desde a vinda de seus despojos para um memorial já prometido pelas autoridades públicas como de sua obra e história. Somente esse resgate pleno o fará retornar para sua cidade, como sempre foi seu desejo em vida.

Atualmente, sequer a obra completa de Cassiano Ricardo existe na cidade. Um alagamento na biblioteca pública que ele inaugurou e leva seu nome, num dia de tempestades de verão, entre 2013 e 2016, inundou o compartimento totalmente inadequado onde mantinham milhares de obras raras e a coleção completa que deu início à biblioteca local –a de Cassiano. Perdeu-se tudo. E uma década depois, ainda falta o movimento necessário, seja por parte das autoridades ou mesmo da sociedade organizada, para reestabelecer o retorno dos livros que marcaram a história da cidade e do Brasil.

APOIO / SUPERBAIRRO

“Não se conhece o poeta sem se conhecer sua obra”, vaticinava o professor e amigo de Cassiano Ricardo, Luiz Gonzaga Pinheiro, um dos organizadores da primeira Semana Cassiano Ricardo. Hoje o literato maior continua sendo um pálido ponto na cultura joseense, vale-paraibana, paulista e brasileira. Cercado ainda por muito preconceito, algo que nasceu e persiste nas bocas da mediocridade e da ignorância.

Cassiano resiste, sim! Mas pelo gigantismo de um gênio diante dos barbarismos cometidos pela infâmia, inclusive de não se ter sua obra reeditada –fantástica, por sinal, e que atravessou e se renovou durante todo o período modernista até chegar ao movimento da poesia concreta.

Poeta preferido de Oswald de Andrade, declamado por Tom Jobim (outro gênio, casado com uma joseense, e que morreu há exatos 30 anos), lido por Bruna Lombardi, amigo pessoal de Drummond, Bandeira, Thiago de Mello, Cecília Meireles, Menotti, Guilherme de Almeida, Gilberto Freire, João Cabral, também colecionou o ódio de acadêmicos e escritores menores, muito menores, como esse sentimento abjeto torna as pessoas. Principalmente no campo intelectual.

Cassiano Ricardo aguarda reencontrar a flauta roubada, que se trata de sua própria cidade natal.

 

> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.

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