Pirô Piraquara passando pela praça Afonso Pena: blocos revolucionaram o Carnaval joseense. Foto / Claudio Vieira/PMSJC

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

– Te conheço de outros Carnavais.

Era assim que as pessoas diziam quando queriam falar de alguém meio manjado. Pois os Carnavais eram assim, meio manjados também. Todo ano quase a mesma coisa que no ano anterior. E foi assim que o Carnaval começou a ficar um pouco chato para a grande maioria da população.

Digo grande maioria porque uma minoria passou a dar um jeito de viajar para curtir a festa em cidades que simbolizavam a folia, como Salvador e Rio de Janeiro. O Rio, ainda com um magnífico desfile das escolas de samba, Salvador com os inigualáveis trios elétricos puxados pelos ídolos do axé, como Ivete Sangalo e companhia.

De uns anos para cá, quem diria, São Paulo deixou de ser o “túmulo do samba”, título que lhe teria sido dado pelo poeta Vinicius de Moraes –há controvérsias quanto à autoria da frase–, para rivalizar com as escolas cariocas. Porém, tanto no Rio quanto em São Paulo, as escolas fazem um show para turistas e para convertidos, aqueles que gravitam em torno do mundo do samba.

E o povão? A classe média? As crianças? O que faziam durante o Carnaval até recentemente? Fugiam para a praia ou para o mato, deixando vazias as cidades sem muita tradição carnavalesca. E tudo continuaria assim, meio sem graça, caso não ressurgisse pouco a pouco um formato de folia que já foi tradicional: o Carnaval dos blocos.

Isto mesmo, os blocos. Eles foram voltando com força no Rio de Janeiro, começaram a crescer em São Paulo, no Nordeste, avançaram em cidades de todo o país, até que hoje dá para dizer que o Carnaval brasileiro ressurgiu com toda a força que merece ter. Para você ter uma ideia, neste ano as ruas paulistanas serão palco de nada menos que 511 blocos, devidamente autorizados pela Prefeitura. Isto sem falar em blocos não oficiais. A estimativa é de 14 milhões de foliões nas ruas da Capital.

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Entre os blocos de São Paulo, os principais são os seguintes: Casa Comigo, Bloco da Favorita, Acadêmicos do Baixo Augusta, Monobloco, Sargento Pimenta, Tarados Ni Você, Agrada Gregos, Bicho Maluco Beleza, entre outros. No Rio, os mais tradicionais continuam sendo Cordão do Bola Preta, Cacique de Ramos, Banda de Ipanema e Suvaco do Cristo.

Porém, Rio e São Paulo, apesar do gigantismo, não rivalizam com os principais blocos nordestinos. Em Salvador, destacam-se o Filhos de Ghandhy e o Ilê Aiyê, enquanto em Pernambuco o Galo da Madrugada e o Homem da Meia-Noite fazem a festa nas cidades vizinhas de Olinda e Recife.

Como curiosidade, fica o registro de que o Galo da Madrugada passou a figurar desde 1995 no Guiness, o livro dos recordes, como a maior agremiação de Carnaval do mundo. E para quem pensa que bloco é coisa recente, é bom saber que os mais tradicionais foram criados nas primeiras décadas do século passado. E acredite, a mineira Ouro Preto abrigou o mais antigo bloco carnavalesco do Brasil, o Zé Pereira dos Lacaios, que teria sido fundado no ano de 1867.

Você deve achar que eu sou louco por Carnaval para saber tanta coisa sobre os nossos blocos. Nem tanto. É claro que as informações acima foram garimpadas em vários sites da internet. Na verdade, informação é o que não falta sobre esta festa, a começar por sua origem.

Nem vou me arriscar a falar sobre isso aqui porque o assunto –e o tamanho deste texto– iria longe. Mas vou dizer que a chegada do Carnaval no Brasil teria ocorrido a partir do ano de 1533 com a chegada dos primeiros colonos portugueses à Capitania de Pernambuco. Chamada de entrudo, a festa repetia um antigo folguedo lusitano realizado nos três dias que antecediam a entrada da quaresma.

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Minha neta e o Carnaval

São José dos Campos teve alguns anos de um bom Carnaval de rua, no final dos anos 70 e início dos 80, quando duas escolas disputavam a preferência dos carnavalescos, a Unidos da Vila e a Martim Cererê, tocadas com amor e muito trabalho, respectivamente, pelos carnavalescos José Luiz de Almeida, que foi vereador e chegou a assumir o cargo de prefeito entre os anos de 81 e 82, e o sambista raiz Benedito Calazans. A Martim Cererê foi a primeira escola de samba da cidade, tendo sido criada em 1965.

Conta-se que o Carnaval dos clubes da cidade sempre foi bom. Crônicas do meu vizinho de coluna aqui no SuperBairro, José Roberto Fourniol Rebello, já reviveram com talento esses bons tempos, de forma que eu vou continuar meu texto pisando no asfalto. Foi a partir de 1988 que o Carnaval de São José passou a ser aberto pelo desfile do bloco Pirô Piraquara, organizado pela então recém-criada Fundação Cultural Cassiano Ricardo. Os foliões ocupavam, na manhã do sábado de Carnaval, o trecho de avenida Dr. Nélson d’Ávila desde o cruzamento com a Dr. João Guilhermino e irrompiam rumo à praça Afonso Pena, terminando a festa no final da rua Quinze de Novembro.

Poucos imaginavam –eu mesmo era cético–, mas o Pirô acabou se tornando o precursor do atual Carnaval de blocos joseense, uma folia que leva famílias inteiras às ruas para brincar, apenas brincar, sem competir, sem se estressar, sem querer ganhar troféu.

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Na sequência, surgiu o bloco “Lá em Cuba, em Cuba Lá”, formado por pesquisadores, ex-estudantes e estudantes do Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que passou a sair pelas ruas da Vila Adyana e Vila Ema, realizando o “esquenta” em frente à portaria do Parque Vicentina Aranha.

Quase ao mesmo tempo, em 2012, o próprio pessoal do Vicentina criou o Bloco da Galinha D’Angola.  Dentro dele, surgiu o Bloquinho D’Angolinha, especialmente para as crianças.

E hoje ninguém mais segura o Carnaval de blocos em São José, que já se espalhou por outros bairros da cidade. [Acompanhe aqui no SuperBairro, nos próximos dias, a programação completa do Carnaval 2023].

Para encerrar esta crônica pré-carnavalesca, digo que os blocos estão produzindo hoje os foliões que irão animar o nosso Carnaval no futuro. Não acredita? Pois é, sou eu quem tenho de aguentar uma menininha espoleta, com seus cinco anos e meio, me cobrando todo dia:

– Vô, não quero nem saber, eu quero uma fantasia porque eu vou sair no bloco da galinha!

 

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

APOIO SUPERBAIRRO

*Texto atualizado às 7h22 do dia 10/2/23 para revisão ortográfica e de estilo.