“Não há bem que sempre dure e nem mal que nunca se acabe.”
O ditado popular pode ser usado para explicar a reviravolta –no bom sentido– que o esporte de elite sofreu nos últimos dois ou três anos em São José dos Campos. Saímos do “não há mal que nunca se acabe” e, espera-se, entramos na fase do “bem”. Que ele dure por muito tempo.
Vamos voltar um pouco no tempo. Programas como as escolinhas esportivas e o Atleta Cidadão fizeram uma revolução no esporte do município. Primeiro, abrindo as portas para a iniciação esportiva das crianças e, em seguida, colocando as mais aptas em equipes competitivas das categorias de base.
Ao mesmo tempo, a Lei de Incentivo Fiscal (LIF), aprimorada a cada ano que passa, permite que empresas patrocinem as mais diversas modalidades e descontem do valor do imposto que devem pagar ao município. Esse apoio, que é indispensável, atinge desde o manjado futebol, passa pelo basquete, handebol, natação, futsal etc. e chega até modalidades quase desconhecidas do povão, como rúgby e wrestling.
Também ao mesmo tempo, a Prefeitura garante uma rede de espaços esportivos –piscinas, campos de futebol, quadras poliesportivas, tatames etc. –espalhados por toda a cidade. Clubes particulares abrem seus espaços para o esporte e recebem desconto no valor do IPTU, o Imposto Predial e Territorial Urbano.
Esse modelo, que vem sendo aperfeiçoado de ano para ano, vem garantindo a São José dos Campos uma hegemonia estadual na maioria dos esportes. Prova disso são os títulos em Jogos Regionais e Jogos Abertos do Interior, além de campeonatos estaduais e nacionais de dezenas de modalidades.
Tudo isto já bastaria para carimbar o esporte da cidade como um “case de sucesso” e um exemplo a ser seguido. Porém, o joseense quer mais. Basta conversar com os mais velhos e eles dirão, com ar saudosista:
– Bom mesmo era quando o basquete tinha Ubiratan, Carioquinha, Marcelo Vido, Zé Geraldo, Nilo e, ainda por cima, era comandado pelo Edvar. A gente foi campeão estadual e brasileiro em cima da Francana e quase fomos campeões sul-americanos, ficamos com o vice…
– No futebol, aqui no Martins Pereira e fora dele, a Águia voava alto, era quase imbatível. Chegamos a disputar o Brasileirão nos anos 80 e, em 89, fomos vice no Paulistão, só perdemos pro Tricolor. Saudades do Tião Marino, Edinho, Nenê, Beto Fuscão, Darci, Tony, Ademir Mello e outros craques…
Era assim. Mas, convenhamos, eram outros tempos e um modelo que nunca mais poderia se repetir.
No futebol, a Urbam assumia a equipe, cuidando de arrecadação, pagamentos de atletas e comissão técnica, cedendo o estádio para os jogos e bancando tudo o mais que envolve uma equipe profissional de futebol.
No basquete, a Prefeitura ajudava a trazer os futuros ídolos contratando-os como instrutores esportivos. E, acredite, eles davam aulas nas escolas e em outros espaços municipais.
O tempo passou e a legislação em torno dos gastos públicos foi sendo aprimorada. Veio a Lei de Responsabilidade Fiscal, os tribunais de contas ficaram mais rigorosos e as Prefeituras não puderam mais apoiar os esportes profissionais como apoiavam.
Além disso, quanto valeria hoje um pivô como Ubiratan? Ou quanto ganharia por mês um atacante como Tião Marino? Trezentos mil por mês? Ou seja, nem pensar…
Os bons tempos voltaram?
Resumindo: o modelo do esporte de elite mudou. As equipes vivem principalmente de patrocínio, as competições são grandes espetáculos na mídia, os espaços esportivos se transformaram em modernas arenas. Não há mais lugar para amadorismo em modalidades como futebol, basquete, vôlei, futsal, entre outras.
Aí entra a receita de sucesso que os gestores públicos do esporte de São José dos Campos começaram a aplicar. Veja os ingredientes:
1 – Espaços esportivos apropriados – O Estádio Martins Pereira foi reformado e se adequou às exigências atuais de maior conforto e segurança; o Teatrão da Vila Industrial foi concluído e, além de ser considerado a “casa do Programa Atleta Cidadão”, tem tudo para ser a nova casa do basquete joseense; e a cereja do bolo, a Arena Municipal de Esportes, foi concluída e transformada em um dos melhores espaços esportivos do país. Ou seja: nosso esporte já tem onde se exibir.
2 – Concessões de espaços esportivos – Outra boa tacada do poder público foi conseguir atrair empresas para operar os espaços esportivos. A manutenção dessas grandes arenas é cara e não se paga somente com os ingressos dos jogos, devendo ter uma gestão profissional promovendo eventos e recebendo grandes shows musicais. Assim, não se gasta dinheiro público para conservar espaços que, nas mãos da Prefeitura, certamente dariam prejuízo.
3 – Investimento privado nas equipes – Aí entrou a LIF, já mencionada acima, que hoje está adaptada para atrair investimentos de empresas, que se sente seguras para montar boas equipes. Gigantes regionais como Farma Conde, Oscar Calçados, DM Card e a sempre presente Vinac Consórcios –entre dezenas de outros patrocinadores de todos os tamanhos– garantem o indispensável “din-din”, o “cascalho”, a “grana” para trazer atletas e comissões técnicas de alto nível.
4 – Futebol-empresa – No futebol, o São José Esporte Clube deu adeus a anos e anos de crises quase intermináveis, com incêndios sempre apagados pelo valoroso Robertinho da Padaria, e fez o que era certo: transformou o clube em uma SAF (Sociedade Anônima do Futebol), que foi assumida pelo Grupo Oscar. Finalmente, a Águia do Vale entrou na era do futebol-empresa.
O importante é competir?
Pronto. Ingredientes providenciados, receita perfeita para que o esporte de elite da cidade tenha vida própria e longa. E os resultados estão surgindo rapidamente.
– Com a Farma Conde, o vôlei subiu ao grupo de elite da modalidade, com ótima participação na Superliga e conseguindo o vice na Copa Brasil.
– Com a Oscar, o nosso basquete também subiu de produção, chegando pela primeira vez em muito anos aos playoffs do NBB, a principal categoria da modalidade, além de obter vitórias importantes contra candidatos ao título.
– Nem é preciso dizer que, no futebol, a cidade está festejando até agora o acesso da série A3 para a A2 em 2024. Há quem aposte que, da A2 para a A1, não vai demorar muito –por que não já no próximo ano? E tem mais: neste sábado (13), o São José Esporte Clube poderá conquistar o título da A3, bastando um empate no jogo contra o Capivariano, fora de casa.
Como se costumava dizer, o joseense anda rindo à toa com o seu esporte. E demonstra a sua felicidade com o basquete lotando o Teatrão, o vôlei enchendo a Farma Conde Arena e o futebol superlotando o Martins Pereira. Até final de Superliga de vôlei já recebemos!
Para finalizar, além de cumprimentar a todos os envolvidos, do passado e do presente, fica um recado para o exigente torcedor joseense: vai com calma, devagar e sempre, comendo o mingau pelas beiradas, porque o apressado come cru.
Não quero aqui pregar a filosofia do velho barão de Coubertin, ao dizer que “o importante é competir”. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra. Penso que o correto é não achar que só o campeão merece aplausos. Em cada competição, um vai ganhar e outros 15 ou 19 irão disputar para chegar o mais próximo possível do título.
Que o esporte de São José dos Campos continue evoluindo, com sucesso nas categorias de base, competitividade nas modalidades de elite e bons espetáculos para o torcedor assistir. Claro, sempre que possível, conquistando títulos, mas sem fazer loucuras, pois tão importante quanto vencer na elite do esporte é ser um dos participantes desta elite.
E dá-lhe Águia!
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 22 anos.