Cristóvão: ansiedade na véspera da abertura da casa de Santos Dumont, 17 anos após o início da obra. Foto / SuperBairro

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Um dos líderes do movimento de defesa da memória do polo aeroespacial de São José dos Campos, Cristóvão Cursino comandou o início da obra da casa de Santos Dumont, em 2006; 17 anos depois, participou da sua inauguração

 

WAGNER MATHEUS*

Na manhã ensolarada do último dia 21, uma terça-feira, véspera da inauguração da “A Encantada”, réplica da residência de verão projetada e construída pelo inventor Santos Dumont na cidade de Petrópolis (RJ), o empreendedor cultural Cristóvão Cursino deixou o seu apartamento, a cerca de 500 metros do local, para assistir aos últimos preparativos para a entrega da obra.

Cristóvão não conseguia disfarçar a mistura de ansiedade e orgulho ao se deparar com a imponente construção, que reproduziu com minúcias a residência original. “Meu projeto pessoal está pronto”, disse, com orgulho, ao SuperBairro. “Fica o exemplo de que, com dedicação, é possível conseguir promover mudanças.”

À frente da Associação Comercial e Industrial de São José dos Campos no início da década de 1990, Cristóvão colocou a entidade na defesa da memória aeroespacial. Anos depois, foi um dos fundadores da ABCAer (Associação Brasileira de Cultura Aeroespacial), que se transformou na gestora de todas as ações.

No dia 22, uma quarta-feira, ele foi um dos chamados a abrir “A Encantada” para mais de uma centena de convidados que participaram da cerimônia. A fita foi desatada ao lado do prefeito Anderson Farias (PSD), do diretor geral do DCTA (Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial), tenente-brigadeiro do ar Maurício Augusto Silveira de Medeiros e do presidente da Câmara Municipal, Roberto do Elevem (PSDB).

José Cristóvão Ribeiro Cursino, ex-empresário do setor gráfico e editorial, tem 67 anos e mora desde 1982 na Vila Adyana. Atualmente, como empreendedor cultural, dedica-se à construção e gestão do Centro de Cultura Popular Ocílio Ferraz, em Monteiro Lobato, que busca preservar e promover as manifestações da cultura vale-paraibana.

No depoimento a seguir, Cristóvão relata em detalhes a sua participação e a de outras entidades, instituições e pessoas para a formação de um patrimônio que visa promover a cultura aeroespacial na cidade considerada “capital do avião”.

Clique [aqui] para conferir como foi a cerimônia de inauguração da casa “A Encantada”.

PUBLICIDADE

Defendendo o polo aeroespacial

“A partir de 1985, com a redemocratização do país, começou também o sucateamento do CTA [Centro Técnico Aeroespacial] e a cidade passou a perder talentos que atuavam no setor. Na ACI [Associação Comercial e Industrial], promovemos em 1992 um show aéreo no Banhado, buscando elevar o astral da cidade.”

Reunindo pessoas e entidades

“Por meio da ACI e do Rotary Clube, empresários e pessoal civil e militar do setor começaram a conversar. Na mesma época, a ACI começou a trabalhar pela revitalização do aeroporto. A partir de um determinado momento, as conversas passaram do Ministério da Aeronáutica para a Infraero [responsável pelos aeroportos do país].”

Criação do MAB

“Fruto dessas conversas, foi a inauguração, em 2004, do MAB [Memorial Aeroespacial Brasileiro], com os esforços da ACI, do Rotary e da ABCAer, a Associação Brasileira de Cultura Aeroespacial, que havia sido criada em 2003. O MAB foi criado para disseminar a cultura aeroespacial e a ABCAer nasceu para ter um papel político, acreditando na possibilidade de promover mudanças através da educação.”

Prefeitura adere ao projeto

“O vice-prefeito do município na época, Riugi Kojima, entrou no processo e a Prefeitura de São José dos Campos participou com o asfalto na área do MAB. A verba para a execução do asfalto só foi possível com a ajuda da Câmara Municipal, através do vereador Walter Hayashi, que destinou parte do valor que seria devolvido pelo Legislativo à prefeitura referente à sobra dos recursos recebidos para as despesas daquele ano.”

Placa em homenagem ao inventor Alberto Santos Dumont, no parque do mesmo nome, que hoje é parque temático de assuntos aeroespaciais. Foto / SuperBairro

Parque temático e portal

“Em 2004, o mesmo vereador Walter Hayashi apresentou –e a Câmara aprovou– projeto de lei dando ao Parque Santos Dumont [na região central da cidade] o status de parque temático do setor aeroespacial. Também em 2004 foi construído o portal de entrada do MAB, em homenagem ao tenente-brigadeiro do ar Paulo Victor da Silva, que foi diretor geral do CTA entre 1966 e 1973.”

O 14-Bis chega ao parque

“Em 2006, iria acontecer a comemoração do centenário do voo do 14-Bis. A Petrobras patrocinou o projeto e uma réplica foi produzida dentro do CTA. Concluída, a réplica foi instalada no Parque Santos Dumont, no lugar de um avião militar que havia no local e ao lado de modelos do avião Bandeirante e de foguetes da família Sonda.”

Começa obra da “A Encantada”

“Como sobrou dinheiro do patrocínio da Petrobras, foi iniciada em 2006 a construção da casa de Santos Dumont, também no interior do parque. Havia o compromisso da prefeitura de concluir a obra. Porém, o vice-prefeito Kojima morreu e, a partir daí, ficou muito difícil a continuidade. Entre 2006 e 2012, apesar das tentativas feitas com as poucas possibilidades que tínhamos, a obra avançou muito pouco. Até que em 2012 a casa foi fechada. Estava com a estrutura pronta, rebocada e com todo o madeiramento. Faltava o acabamento. Havia também parte do acervo que comporia uma espécie de museu. A ABCAer doou tudo o que havia em seu poder para a prefeitura, um acervo composto de peças de uso pessoal do inventor, maquetes, projetos e materiais ligados ao tema. Há cerca de cinco anos, a ABCAer parou com suas atividades.”

“A Encantada” abre suas portas

“Em 2022, eu soube que a Urbam [Urbanizadora Municipal, empresa com capital controlado pela prefeitura] estava terminando a obra, e agora ela está pronta. Vejo a conclusão e o funcionamento da “A Encantada” como a coroação da luta que teve início na década de 1990 e como uma vitória das pessoas e instituições que participaram desta luta, que culmina com a obra servindo para a educação e o turismo de São José dos Campos. É a materialização da identidade da nossa cidade, voltada para o setor aeroespacial.”

Um legado para a cidade

“Fico emocionado e realizado ao ver o aeroporto revitalizado, o MAB implantado, o Santos Dumont como parque temático e, agora, fechando o ciclo, a casa “A Encantada”. Está tudo implantado, tudo virou realidade, não tem como voltar atrás. Espero que o novo espaço seja um ponto de atrações culturais e de visitação para que todos conheçam a participação decisiva de São José dos Campos no setor aeroespacial brasileiro.”

 

*Wagner Matheus é editor do portal SuperBairro.

PUBLICIDADE
PUBLICIDADE