Quem tem o hábito de caminhar pelas ruas, parques e outros espaços da cidade tem sido obrigado a alterar um pouco a rotina nestes dias de ondas de calor. Somente os fortes podem –mas não deveriam– se arriscar a entrar debaixo de um “sol de rachar mamona”, como se costumava dizer.
Como esta que estamos vivendo já é a segunda onda de calor neste ano –e outras são aguardadas até o final do verão que apenas começa nesta sexta-feira, dia 22–, quem tem pele sensível e cabeça no lugar tem optado por antecipar a saída para o exercício diário, ou o inverso, por deixar a atividade para mais tarde, pois “a noite é uma criança”, como também dizem por aí.
Já fui um caminhador mais habitual, porém nos últimos meses fiquei meio preguiçoso. Até que resolvi, justamente nesse período de “calor senegalesco”, voltar a exibir a minha brancura nas ruas. No último domingo, saí de casa por volta de 7 da manhã, me achando o máximo.
No meio do trajeto, que envolveu os bairros da Vila Ema, Jardim Esplanada, Vila Adyana, São Dimas, Jardim Maringá e, novamente Vila Ema, cheguei esbaforido lá pelas 8h30. Descobri que, se não quiser sofrer, preciso começar a andar no máximo às 6 da matina. Justo eu que não sou muito matutino, meu relógio biológico sempre preferiu a noite.
Encontrada a solução para fugir das altas temperaturas com que o tal El Niño está nos presenteando, passei a prestar atenção em outros aspectos da rotina de percorrer ruas e bairros da cidade sem o uso de automóvel. Um deles é um velho conhecido, o problema da arborização urbana. O SuperBairro e eu, temos abordado o assunto sempre que ele se torna urgente e grave. Tento dar um sossego ao leitor, mas se dependesse de mim haveria reportagens, crônicas e artigos quase diários sobre a nossa relação com as árvores.
Já desconfiava disso, mas percebi durante a caminhada de domingo passado que o sol do início da manhã estava difícil de suportar quando atingia diretamente o meu corpo, mas quando eu passava por baixo das árvores das ruas e avenidas do percurso –quanto maiores, melhor–, eu parecia entrar em um túnel que iria me levar ao paraíso. Dava até um delicioso “friozinho” de vez em quando, dependendo se batesse uma brisa um pouco mais forte.
Não vou calcular aqui a diferença em graus centígrados entre o sol direto e o sol filtrado pelas árvores. Prometo que ainda vou fazer isto no SuperBairro, esse assunto não vai parar por aqui. Até porque isto tudo me faz lembrar, pela enésima vez, que bairros antes privilegiados por uma arborização exuberante, formada por espécies imponentes e belíssimas, estão perdendo esse tesouro natural. E o que é pior: esse tesouro não está sendo reposto.
Só não vê quem não quer. A região do centro expandido da cidade –também conhecida como centro novo, ou antiga zona sanatorial– tem perdido muitas árvores por motivos variados: quedas durante tempestades, supressões por “adoecimento”, retiradas por causa do avanço das raízes sobre calçadas e construções, condenações por podas mal feitas que aos poucos vão comprometendo a saúde das árvores etc. etc.
A perda de árvores é um fato e deve ser encarado como inevitável, algumas vezes e, em outras, totalmente evitável. Mas o que ninguém consegue compreender é que a perda de uma árvore não é compensada pelo replantio de uma outra árvore no mesmo local. Sim, uma muda já crescida e de espécies mais adequadas para dar sombra, melhorar o ar e embelezar o local exato que perdeu a árvore que estava lá.
A Prefeitura de São José dos Campos parece não concordar comigo, porque comemora seus feitos nessa área. Tanto é assim que outro dia ela divulgou um press-release anunciando: “Pela excelência na gestão do patrimônio arbóreo, São José dos Campos irá sediar o 4º Fórum Latino-americano de Florestas Urbanas em novembro de 2024. A confirmação veio durante a programação do 2º Fórum Mundial de Florestas Urbanas, que ocorreu entre os dias 16 e 20 de outubro, na cidade de Washington D.C, nos Estados Unidos”.
Pois é. Vem aí um grande evento para todos soltarem rojões pelo trabalho da nossa prefeitura na área da arborização urbana. Mas, antes disso, bem que o responsável pelos nossos “indivíduos arbóreos” poderia me acompanhar na próxima caminhada e comprovar que precisamos melhorar muito, principalmente repondo as árvores que perdemos, exatamente nos mesmos locais em que elas morreram.
Depois da caminhada, a cerveja é por minha conta.
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 48 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 22 anos.