Foto / Claudio Vieira/PMSJC

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

– Te conheço de outros Carnavais.

– Já não se faz Carnaval como antigamente.

Cada um tem uma frase para expressar a sua saudade em relação aos antigos Carnavais. Podem ser os que aconteceram até uma determinada época, ou um específico, quando, por exemplo, a pessoa conheceu a sua outra metade.

Sendo o Carnaval uma festa cheia de emoções e expectativas, é natural que a nossa memória afetiva nos remeta aos bons Carnavais que já vivemos. E fica sempre aquela impressão de que o que passou foi melhor do que o que virá.

A morte do Carnaval brasileiro já foi decretada muitas vezes. Começando com o fim dos corsos, quando famílias inteiras percorriam as ruas dentro de antigos automóveis munidas de muito confete, serpentina e lança perfume. Eram Carnavais elitistas: os ricos passando de carro e os pobres assistindo das calçadas –e aplaudindo.

Quase simultaneamente, nasceu o rádio para dar amplitude às canções carnavalescas, que tinham seu estoque obrigatoriamente renovado a cada ano. Quase todos os grandes artistas da época gravavam pelo menos uma música para empolgar os foliões. E o rádio transformava essas músicas em sucessos nacionais.

Esses sucessos serviam para animar os salões dos clubes de todo o país, vender discos e render uma graninha para os autores e intérpretes. Até que, por volta da década de 70, as novas gravações começaram a rarear e o povo teve que se acostumar com as marchas e sambas de Carnavais passados.

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Algumas décadas depois, as escolas de samba, que começaram levando a população humilde dos morros cariocas para uma brincadeira inocente nas ruas da cidade, passaram a ganhar cada vez mais adeptos, inclusive nas classes mais abastadas. Ano após ano, as novidades cariocas da avenida davam ideias para outros estados e cidades, e ter escola de samba passou a ser quase uma obrigação.

Espetáculos a cada ano mais luxuosos –e uma inexplicável “obrigação” de vencer– levaram as principais escolas de samba a investir fortunas em seus desfiles, dar lugar a artistas famosos e exigir uma disciplina quase militar dos seus integrantes, que lá no início só pensavam em se divertir e agora eram advertidos caso errassem passos e evoluções ou o batuque na bateria. Ficou meio sem graça para o povão.

E quando muita gente achava que Carnaval era coisa do passado e o melhor a fazer nos quatro dias era descer para a praia ou subir para as montanhas, não é que uma antiga tradição passou a ganhar as ruas e trazer de volta a diversão descompromissada de brincar Carnaval por brincar? Sim, os blocos passaram a ocupar mais espaço, primeiro em Salvador, Recife e Olinda, depois incrementando os já tradicionais blocos cariocas e, acredite, transformando a cidade de São Paulo em um dos epicentros da alegria dos foliões com inacreditáveis 590 blocos no Carnaval deste ano.

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Percebeu? Não é preciso gravar novas músicas de Carnaval, nem suportar o abafamento dos salões, muito menos ser soldado na rígida estrutura das escolas de samba. Basta colocar uma roupinha –quanto menos melhor–, reunir a galera, jogar umas bebidinhas dentro de um cooler, pegar o Uber e chegar na concentração do bloco preferido. Um trio elétrico vai tocar de tudo um pouco e o resto é só alegria.

É claro que também existem os blocos mais profissionais, com venda de abadás, espaço cercado por cordas reservado para quem paga, mas é impossível isolar o som para impedir os não pagantes de se divertirem. Além disso, cada um chega quando quer e vai embora quando bem entender. Carnaval assim é tudo de bom.

Aqui em São José dos Campos, a tendência dos blocos parece ter chegado para ficar. E cresce a cada ano. Os mais democráticos são o Galinha D’Angola, o Pirô Piraquara e o Lá em Cuba, em Cuba Lá. Há também os engajados politicamente, como o Acorda Peão e o Capivara Neon. E aqueles que a gente torce para voltar, como o Engole Sapo.

A cidade tem ganhado também blocos mais segmentados, com venda de abadás e outros confortos. Neste ano, eles ocuparam um trecho da via Oeste. Atraem mais os jovens solteiros e a classe média.

O importante é que a cidade se encaixou perfeitamente na cultura dos blocos carnavalescos. É bom lembrar que o mesmo não aconteceu com as escolas de samba joseenses. Apesar de termos tidos ótimas agremiações, como Martim Cererê, Unidos da Vila e, mais recentemente, Acadêmicos do Satélite, a verdade é que desfile de escola de samba parece que virou coisa do passado em São José.

E que venha o Carnaval de 2025. Por falar nisso, já tem um bloco para chamar de seu?

 

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 48 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 23 anos.

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