Foto / Editora Abril/Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Quem vive sem parentes? A macarronada de domingo, o churrasco ou a feijoada dos sábados, as festinhas de aniversário, o aluguel coletivo da casa de praia para as férias, as fofocas, os desabafos, as briguinhas, as brigonas. Tudo isso –sem falar nos empréstimos, nas causas urgentes–, envolve parentes. Ou seja: quase ninguém vive sem familiares.

E tem ainda o crescimento do grupo. São os amigos dos parentes. Os namorados e namoradas dos parentes, os vizinhos dos parentes, os novos filhos, os sobrinhos, a lista aumenta a cada dia.

Cada um tem o seu modo de lidar com a parentela. Desde juntinha, agarradinha, se vendo todos os dias, até bem distante, sem muita intimidade. Mas não deixam de ser parentes.

E na política, como acontece essa relação? Olha, no mundo inteiro a coisa não é fácil. Os “parentes-problema” estão em todos os cantos do planeta. Mas parece que no Brasil, historicamente, pode-se dizer que “parente é serpente”.

Que o diga o atual presidente da República, nosso notório Jair Bolsonaro. Que azar este homem tem com parentes! Começou com a história da sogra, que acabou falecendo lá no Distrito Federal. Essa tal de mídia foi atrás e descobriu outras histórias não muito edificantes sobre familiares da primeira-dama. Depois, vieram histórias de ex-mulheres do senhor Jair. E desde o início, histórias com os “zeros”, a filharada.

E agora, o que faltava azedar na vida do presidente? É claro, uma ex-cunhada. Que, para Bolsonaro, a esta altura, está mais para “excomungada”. Não é que a moça resolve abrir a boca e falar o que o chefe do clã estaria fazendo com salários de gente que o Poder Público paga para atender a ele e aos filhos com mandato?

E aí fica uma pulga atrás da orelha. Ao abrirem a boca para soltar os podres que estão em suas cabeças, os familiares de políticos não sabem a que risco estão levando os seus parentes vereadores, prefeitos, deputados, senadores e, pasmem, o próprio presidente da República?

Ou será que é por isso mesmo que falam, falam, falam, até que as conversas passem a fazer parte da história política nacional, que já está mais suja que pau de galinheiro? Já ouviu falar daquela famosa inveja do parente menos bem-sucedido em relação aos mais aquinhoados pela sorte?

Pois é, não se sabe a motivação. O fato é que, se você tem carreira política, ocupa cargos importantes no setor público, mexe com altas somas de dinheiro do povo, fique longe dos parentes. A não ser, é claro, que você não tenha nada a temer.

Sem muito esforço, vamos puxar pela memória alguns “parentes-serpentes” dos presidentes brazucas, pulando a República Velha e já entrando no Brasil pós-Revolução de 1930:

– O próprio presidente misto de ditador e “pai dos pobres”, Getúlio Vargas, tinha no irmão mais novo, Benjamin Vargas, o “Bejo”, um problema permanente. Criava encrenca em cassinos e casas noturnas, se metia onde não era chamado e dava “carteiradas” na condição de irmão do presidente. Abro um parêntesis aqui para o deleite dos que estão filiados ao “partido antiglobo-lixo”. Acredite, em uma ocasião, Bejo esbofeteou Roberto Marinho, que estava começando a criar o seu império de comunicação.

– O general Eurico Gaspar Dutra ficou famoso por seguir as ordens da esposa Carmela, mais conhecida por Dona Santinha. Beata católica, como primeira-dama exigiu do marido a proibição do jogo no Brasil e a extinção do Partido Comunista. Foi obedecida.

– No início da década de 1960, como se não bastassem os seus problemas com os militares, João Goulart, o Jango, ainda teve que suportar o “cunhadão” Leonel Brizola, que usava gasolina para apagar os incêndios políticos da época. Ávido por suceder Jango na presidência –sem saber que tudo acabaria no golpe civil-militar de 1964–, Brizola lançou o slogan “Cunhado não é parente!”, já que a Constituição impedia a sua candidatura devido ao laço familiar com Goulart.

– Nem os poderosos generais-presidentes do regime militar ficaram livres do problema. Castelo Branco teria dito a um irmão trapalhão que andava usando seu nome para interesses inconfessáveis: “Demitido [do cargo público] você já está. Ainda estamos decidindo se você vai ser preso”. Costa e Silva teve problemas com a esposa, entre eles uma aproximação não muito ética com o notório Paulo Maluf. Geisel teve que administrar a relação com o irmão Orlando, que tinha pretensões impraticáveis para a sua sucessão. Figueiredo, segundo consta, passou o governo ocultando o fato de já não dividir o mesmo leito com a primeira-dama.

– Chegamos até o governo Collor. Preciso dizer aqui o quanto parente é serpente na política brasileira? Ok, vai que a Geração Z não saiba: o irmão Pedro jogou as últimas pás de terra sobre o caixão político de Fernando com uma bombástica entrevista à revista Veja, viabilizando o primeiro impeachment de um presidente da República no Brasil.

– Aí chega o também notório Luiz Inácio Lula da Silva e brinda o país com filhos “geniais”, com irmão pedindo mesada a empreiteira, com primeira-dama extrapolando o seu espaço.

Precisa mais? E olhe que estamos nos limitando ao topo da pirâmide, aos presidentes da República. Alguém ainda tem dúvida de que, ou o político é o problema, ou parentes seus são problemáticos, ou ambos são um “pepino” na vida dos brasileiros?

Para encerrar, segue o link no Youtube do filme italiano Parente é Serpente, de 1992, do diretor Mario Monicelli, no qual as relações familiares são tratadas com um humor áspero e um final surpreendente. Vale a pena assistir.

Ahh… e abra o olho com os seus parentes. rsrs…

 

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.