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Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Dia 13 de setembro se comemora o Dia da Cachaça, e com tanta tontice rodando por esse país, achei muito apropriado falar de uma coisa realmente importante. Sim, dela mesma, a dona cajibrina, mé, marvada, água que passarinho não bebe, aguardente, cura-tudo, dengosa, engasga-gato, goró, pinga, purinha, ou seja lá como você a conhece.

Eu achei muito legal saber que ela tem um dia, porque essa senhora com quase 500 anos e tantos apelidos –alguns carinhosos, outros nem tanto–, é, a meu ver, um ícone da democracia. Se faz presente nos mais diversos meios, sem preconceito algum.

Tem roupa para todas as ocasiões e as utiliza sabiamente, conforme o local em que se encontra. Nos botecos da vida, chega de branco transparente, sem cerimônia, para atender o freguês que precisa de um limpa-guela.

É a estrela dos bares para turistas gringos, envergando seu vestido de festa mais conhecido mundo afora: a caipirinha.

Está presente, hoje em dia, também em muito rega-bofe sofisticado. Envelhecida no tempo exato, em tonéis de bálsamo, amburana ou carvalho, é produto de exportação. Chega também a peso de ouro nas adegas sofisticadas, rivalizando em tons de dourado com conhaques elegantes e disputados.

Não foi fácil cair nas graças grã-finas, mas, imbuída do mais profundo espírito brasileiro, não desistiu até se ver reconhecida como destilado de valor. Embora ainda falte um longo caminho a ser percorrido para garantir de vez a autoestima.

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Pois é, esqueça o litrão com nome de número, que você pode comprar no supermercado para as caipirinhas no fim de semana. Uma cachaça envelhecida 12 anos em barril de carvalho europeu chega fácil aos três mil reais em uma embalagem de 750 ml, como os melhores vinhos.

A “marvada” frequenta as cozinhas com tranquilidade também, e não é de hoje que a cachaça é utilizada para deixar carnes mais macias e intensificar o sabor. Mas ela passeia por muitos outros pratos. Vai bem no preparo de peixes e no cuscuz. Carne de sol flambada na pinga para o tira-gosto fica melhor ainda, se é que isso é possível.

Tem uma cachaça para cada paladar e para harmonizar como cada bolso permite. A premiada envelhecida abre caminho para o filé e a birita baratinha, em um “copo sujo” qualquer, acrescenta sabor ao petisco de mortadela. No fim das contas, todas as barrigas ficam felizes. Quer melhor que isso?

Arrisco dizer que a cachaça é, provavelmente, o que há de mais brasileiro nessa longa estrada de colonizados que vivemos. Não existe um registro definitivo de quando foi destilada a primeira cachaça, mas há certeza entre os historiadores de que isso ocorreu em território brasileiro, entre 1516 e 1532.

Essa última data, 1532, é também a escolhida por Luís da Câmara Cascudo, no livro Prelúdio da Cachaça. Segundo ele, a primeira cachaça teria sido destilada em São Vicente, no litoral paulista. É uma bebida com muita história pra contar.

Do jeito que vai este país, essa pandemia, esse mundo doido de pedra, só de escrever esta crônica já dá vontade de fazer uma degustação em larga escala. Da “marvada” a cachaça com selo exportação; só pra esquecer um pouco da vida.

Mas então eu me lembro que exageros –de todo e qualquer tipo– trazem ressacas perturbadoras. Sendo assim, melhor beber com moderação.

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> Maria D’Arc Hoyer é jornalista (MTb nº 23.310) há 28 anos, pós-graduada em Comunicação Empresarial. Mora na região sudeste de São José dos Campos. É autora do blog recortesurbanos.com.br.