Tem sido muito estimulante ver a pandemia chegando a um ponto de controle e, se nada der errado, caminhando para ser uma infecção viral que não vai mais amedrontar a ninguém.
A vacinação continua em um bom ritmo. Até domingo (17), mais de 151 milhões e 500 mil brasileiros já haviam recebido a primeira dose. Isto representa 73,1% da população. E 104 milhões 352 mil foram imunizados com as duas doses ou com dose única, ou seja, 48,9% completaram a vacinação.
Em São José dos Campos, eu diria, o ritmo é ainda melhor, quase perfeito. Também até domingo, a Prefeitura aplicou mais de 1 milhão e 71 mil vacinas contra a covid. Isto significa mais de 95% do público-alvo com a primeira dose e mais de 75% com as duas doses ou dose única.
Por isso, o número de mortes, internações e contaminações vem caindo drasticamente. Dos 295 óbitos por covid-19 no município no mês de maio, houve queda para 221 em junho, 102 em julho, 56 em agosto e 26 em setembro. Isso significa que, em quatro meses, as mortes caíram 91,2% em São José.
A média móvel de mortes no domingo estava em 325 por dia no Brasil. Para quem já viu quase 2.500 mortes em 24 horas, a média de 325 é um alívio. Mas nem tanto.
Apesar de todo esse otimismo, não devemos esquecer que em 15 dias e algumas horas, no ritmo atual, poderíamos encher os 5 mil lugares da Arena de Esportes da cidade, que ainda nem foi inaugurada, com corpos de vítimas da covid no Brasil. O leitor me desculpe a comparação um tanto mórbida, mas tem gente que precisa ser estimulada a compreender a gravidade de certos assuntos.
E chega de números. Não é sobre isso que eu vim falar hoje. É sobre respeito, é sobre conscientização, sobre contribuir com tanta gente que está trabalhando para vencer esta pandemia.
Na sexta-feira, por volta de 19h, saí de casa depois de habituais 9 ou 10 horas de trabalho em home office para comprar um inocente remedinho na Farma Conde do bairro.
Mas é claro que antes de sequer olhar que existe uma Farma Conde, os meus olhos focaram a velha, boa e hospitaleira Savema, a sociedade dos amigos aqui do bairro, onde há poucos dias o simpático empresário “Buiu” –como é conhecido– saiu do seu Jardim das Indústrias para reformar o local e se instalar com uma boa equipe.
É claro que o Conde perdeu para o Buiu. Fui até lá e tomei duas cervejinhas devagarinho, relaxando, me recuperando. Foi bom…
Em seguida, por volta de umas 21 horas, passei pela farmácia, comprei o remedinho e pequei o “caminho da roça”. Mas aí, como diz o belo samba do Chico Buarque, “a notícia carece de exatidão”.
Porque, parafraseando também o imortal Drummond, “no meio do caminho tinha uma pedra”. Uma pedra? Não, não era bem isso. É um bar tradicional, bar de uma família amiga, de garçons amigos, mas que está exatamente no meio do caminho entre a farmácia e a minha casa.
Ora, qual é o problema de beber mais umas duas cervejinhas admirando o ambiente?
Digo admirando o ambiente porque, depois de ter até excesso de companhia durante mais de 30 anos, fiquei “véio” e os meus amigos de sempre parece que ficaram ainda mais “véios”, não saem mais de casa.
Paciência, não nasci grudado neles e o bar é de amigos. Cheguei, entrei, ocupei uma mesinha, pedi uma Skol puro malte. Sou modesto com cervejas, gosto das mais básicas, porém supergeladas e servidas no copo adequado. Ah, também não suporto que o garçom queira colocar cerveja no meu copo, isso é uma habilidade minha para ganhar alguns dedos de colarinho branco contrastando com o amarelo da “breja”.
Enfim, devidamente instalado, comecei a interação de sempre: bater um papinho com os donos, com o gerente, com garçons menos estressados (rss…), dar uma espiada no futebol e em outras atrações passando em três monitores de TV, eu batucando no meu celular pra me atualizar com as novidades. Tudo perfeito… ou quase.
O problema é a galera
O bar estava cheio, mas controlado. Não sei o que se chama hoje de aglomeração, mas acho que não havia isso. Até porque o pessoal desse bar andou tendo problemas com uma “freguesia” daquelas que acha que sempre cabe mais um. Hmmm, este era o slogan de um sabonete antigo, “sempre cabe mais um”, mas não vou dizer qual é porque vão me chamar de “véio”.
O público era composto em sua maioria por jovens, bem jovens mesmo, aparentemente quase todos de classe média, desde a média/baixa, penso que a maioria da média/média e, com certeza, alguns da média/alta.
Ou seja, gente saudável, gente que estuda, gente que quer se divertir com a galera no final de semana. Com todo o direito. Acho que a maioria dos grupos era de amigos de colégio e de “facul”. Sou “véio” mas sei falar facul…
Mas aí a minha diversão começou a se transformar em um estranho jogo de Tom & Jerry. Como nos meus tempos de escola, passei a observar atentamente, entre um gole e outro, todos os personagens que sempre existiram nesses grupos: tem o engraçadinho, o palhação, o popular, o inquieto, o exibido e, é claro, o rebelde. E isso vale para todos os vários gêneros atuais.
Até aí tudo bem. Sempre foi assim e é até saudável que seja. Porém, “ai, porém, há um caso diferente, que marcou meu breve tempo…”, como diz o samba do Paulinho da Viola, esses personagens destacados dos 80% ou 90% de jovens adaptados ao ambiente e às exigências para estar nele, não gostam de usar máscara.
Por que não gostam? Ora, porque cada um compõe o tipo a que se propõe: o rebelde porque gente rebelde não usa máscara; o engraçado, porque de máscara vai perder a graça; o popular, porque pode perder sua liderança e influência no grupo. E assim por diante.
Verifiquei que o bar contratou seguranças somente para cuidar dessa tribo que não respeita as regras. E vi que eles tinham que encenar o mesmo joguinho de Tom & Jerry: ficar de olho, flagrar, caçar o bichinho pelo salão e comunicar a obrigatoriedade da máscara para, em seguida, receberem risadinhas, desculpinhas etc. etc.
Meio exasperado, mudei de mesa para uma um pouco mais isolada. Mas há quem diga que eu atraio… logo estava “tudo como dantes no quartel de abrantes”, já se dizia lá em Portugal no período das invasões napoleônicas.
Fim de papo. A conta…
Era quase madrugada quando tudo começou a se acalmar, os grupos foram pagando suas contas, se despedindo alegremente, até que as mesas e cadeiras começaram a ser erguidas. Uma trégua até o dia seguinte, quando vai começar tudo de novo.
Mas não para mim, espero. Porque pensei, pensei muito e conclui que essas gerações e eu já não podemos nos divertir juntos. Não dá mais. E acho que a “culpa” é minha. Afinal, o que faz alguém que frequentava o “Pilão” nos anos 80, ali na praça Cândido Dias Castejón, ou o “La Cave”, na rua detrás, dividindo o ambiente de um bar com gente do Poliedro, do Anglo etc. etc. Não ria, mas é a mais pura verdade.
Além do mais, tenho que me livrar do vexame. Não estaria longe o dia em que, logo ao entrar no lugar, seria recebido com um coro de “tiozão da Skol”. Não mereço isso, não mesmo…. rsss…
Esta é uma despedida dos bares cheios de jovens nas noites de sexta ou sábado. Como se dizia antigamente, vou procurar a minha turma. E bares parta “véios”, em horários alternativos… Vou pendurar as chuteiras das noites divertidas com a galera.
Só espero não fazer como o ex-cantor Silvio Caldas, que “pendurou as chuteiras” da carreira por tantas vezes –e não cumpriu– que se desmoralizou. Ih, falei de Silvio Caldas? Mas que coisa de “véio”…
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.