Foto / Polícia Militar/Divulgação

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Tem gente que diz que eu sou radical. Tem gente que diz que eu sou perfeccionista. Tem gente que diz que eu sou chato. Talvez todos tenham razão.

Não nasci chato, não cresci chato, não vivo chatamente. Mas confesso que tenho a péssima mania de encarar as regras como reais, sérias e que devem ser cumpridas. Minha neta vai fazer cinco anos em julho, mas já é mais sagaz do que eu era talvez aos dez. Quase todas as crianças de hoje são assim, tenho certeza. Ela é muito observadora e resolveu me chamar, outro dia, de pianista. Pensei, esta menina enlouqueceu. Mas quando ela se explicou, entendi o meu mico.

“Vovôco, você toca piano no fogão, né?”, disse a maluquinha. Aqui entre nós, um dia passei a chamá-la de neneca e a bonitinha começou a me chamar de vovôco. Em seguida, a vovó dela virou vovoca. A menininha é tão esperta que eu jamais imaginava o quanto. E é verdade, eu toco sinfonias inteiras no fogão. Cada vez que passo pela cozinha, dou uma batidinha em cada uma das seis “teclas” que abrem e fecham o gás. E ela notou, é óbvio.

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Voltemos ao meu radicalismo e o adicionemos ao meu “toc” –transtorno obsessivo-compulsivo– de perfeccionismo. A soma dá um sujeito que gosta de seguir regras. Acho até que nem todas as regras são fundamentais, mas também acho que não cumprir uma abre caminho para não cumprir as demais.

Tenho conseguido arrumar encrencas nesses anos de pandemia de covid-19. Sem querer-querendo, me transformo em uma espécie de inspetor de quarteirão que vigia todos e todas as pessoas 24 horas por dia.

Outro dia estava em um bar. Todos, ou quase todos, 99%, estavam se divertindo e cumprindo as medidas sanitárias. Mas –e sempre tem um mas–, à medida que a noite vai entrando, também entram no bar aquelas pessoas que desprezam regras e, mais ainda, que querem desafiar e desmoralizar as regras.

Aí é difícil aceitar. Dizer o quê? Ignorância? Analfabetismo? Não sei. Mas tenho o grande azar de encontrar gente assim no meu dia a dia (ou noite a noite). Como o regime é democrático, todos podem frequentar os mesmos espaços. Pena que alguns não saibam se comportar para respeitar o direito dos demais.

Fica, então, aquela “guerra” entre a realidade e a ignorância, entre o desejo de seguir as regras e o desprezo por elas, entre quem estudou e aprendeu e quem até estudou, mas não aprendeu nada.

Tem gente que se acha diferenciada nesses ambientes. Ou seja, acha que é esperta em uma maioria de otários. Será? Qualquer psicólogo iniciante vai dizer a esse cidadão que, se a maioria age de um modo e ele age de outro, a tendência é que o idiota seja ele.

Seguir regras em uma comunidade vale não só para a prevenção à covid-19, mas para tudo na vida. Vale para o trânsito, para as filas, para as grávidas e idosos poderem se sentar no transporte coletivo, para as crianças serem respeitadas e protegidas etc. etc.

Eu sinto profundamente quando vejo, nos dias de hoje, gente que frequentou escola agindo como troglodita, ou seja, gente do tempo das cavernas.

Sei que sempre fomos a civilização do jeitinho, do laissez-faire (deixar as coisas acontecerem), da minimização das responsabilidades. Mas ninguém pode ser isento de cumprir as regras por ser mal alfabetizado, pouco inteligente ou simplesmente ignorante.

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Estou escrevendo esta crônica porque tenho visto um relaxamento inexplicável com relação aos cuidados com a transmissão do coronavirus que leva à covid-19. Nesta última semana voltamos a ter no Brasil mais de 1 mil mortos em 24 horas devido à covid. Os ignorantes dirão que os números são inventados. Outros, também ignorantes, dirão que os grandes laboratórios espalham essas notícias para alarmar a população e aumentar seus lucros.

Tenho um conhecido, profissional brilhante, que resolveu, de repente, ser um “médico brilhante”. Tem mais de 60 anos, não tomou sequer uma dose de vacina e diz que não vai “fazer o jogo” dos fabricantes de medicamentos e dos governos.

Alguém assim é uma espécie de bomba ambulante ou mina terrestre pronta a explodir gente inocente. Coitado de quem estiver por perto na hora agá. Quando “acordar”, já recebeu ou, sem querer, transmitiu o vírus.

Tudo isto me faz lembrar as histórias que correm mundo afora sobre pessoas conhecidas do mundo artístico, da política e de outras áreas de atividade que se recusam a se vacinar e acabam perdendo a vida. Mas existe coisa pior. A última “moda” é gente que procura forçar a contaminação para conseguir algo que chama de imunidade natural. Uma artista europeia fez isso e morreu de covid.

Enfim, sei que covid é um assunto do qual ninguém mais suporta ler ou falar. Mas é necessário. Falar, ler e continuar seguindo regras, se vacinando, até que o vírus volte a ser insignificante. Enquanto isso não acontece, tome cuidado com a turma do laissez-fare.

Ah… antes que eu me esqueça, o Carnaval vem aí. Já pensou em que bloco você vai sambar? No dos prevenidos ou no dos que deixam o vírus pular junto na folia?

 

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

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