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Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Corria o ano de 1970, na Fiscalização da Prefeitura de São José dos Campos, de repente entra um novo chefe, reunidos os fiscais com urgência, para fazer uma comunicação importante aos valorosos agentes:

–– Meus caros, desde que comecei como chefe há poucos dias –anunciava em tom grave e pomposo− já percebi algo muito sério no comportamento dos fiscais, o que, aliás, preocupa sobremaneira o prefeito Sobral. Vocês sabem como ele é rigoroso. É que muitos dos que saem em viaturas e lambretas não têm mantido a compostura que se exige de agentes da Municipalidade. Recebemos denúncias de que andam mexendo com mulheres pelas ruas, o que não é admissível. Portanto, passo a seguinte ordem: é proibido mexer com mulher de chapa branca!

Não querendo desmerecer muitos dos companheiros fiscais –sim, eu trabalhava lá depois da desativação do Conselho Municipal de Cultura– havia alguns muito simples, da velha divisão do tempo do prefeito Veloso. O novo e rígido prefeito, o Brigadeiro da reserva Sérgio Sobral de Oliveira, assumiu o cargo nomeado pelo Governador e veio como um furacão.

Tentou inovar tudo, inclusive essa fiscalização de posturas. Nomeou novo chefe, transferiu para lá universitários, mandou contratar outros nos cursos de engenharia e arquitetura da Univap. Todos usando gravatas. Enfim, queria uma fiscalização renovada e de melhor nível e os remanescentes, aos poucos iam sendo substituídos.

Depois do solene discurso do novo chefe, hoje falecido, alguns daqueles velhos fiscais ficaram matutando para saber quem era a tal mulher de chapa branca.  Não atinavam como as mulheres podiam ter chapa branca, não percebendo que a chapa branca era da viatura ou da lambreta, não das pedestres. Mas diante dessa fala ambígua do novo patrão, ficaram confusos.

Para os outros, os universitários, virou meme. Ficavam debochando: ––não vai mexer com mulher de chapa branca, senão vai tomar bronca do chefe! E aí por diante, pode-se imaginar o que inventavam a partir dessa fala infeliz.

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A Prefeitura de São José, aliás, era um lugar pleno de fatos estranhíssimos, supostos fantasmas e brincalhões de todo tipo. Daria um livro narrar todas as situações cômicas ali acontecidas, algumas absurdas –ao que parece uma constante em repartições públicas neste país varonil.

Nos quatorze anos que lá estive, oito como Procurador Judicial, ouvi dizer, presenciei muitas brincadeiras entre funcionários e até participei, de leve, de algumas. Nada ilegal, nem que prejudicasse o interesse do munícipe, ressalve-se.

Só para ficar na Fiscalização, curioso episódio daqueles tempos arrancou risadas e preocupações, fato sucedido com um daqueles fiscais antigos, em 1971. O cidadão saía para fazer sua ronda ou entregar notificações relativas à construção de muros e calçadas e voltava somente no fim da tarde para bater o ponto. Um dia, ao sair, foi barrado pelo chefe, que queria saber o que levava sempre numa mochila, afinal, para que portar tanta coisa?  Ao retirar os pertences do seu embornal, o fiscal mostrou ao chefe um grande relógio despertador, daqueles com duas campainhas, suficiente para acordar um batalhão inteiro.

Ora, o que fazia o fiscal com aquele despertador? Servia para que no seu serviço?  Confrontado pelo superior, respondeu candidamente o provável dorminhoco:

–– O despertador é pra não perder a hora de voltar e bater o ponto.

Foi substituído.

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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