Resgate, o vira-lata que trabalhou muito em Brumadinho. Foto / Sérgio Rocha Repórter/Facebook

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

A gente sabe que quando eles estão trabalhando, infelizmente, é sinal de que alguma tragédia aconteceu (anunciada ou não), mas não podemos negar que o trabalho dos cães farejadores é essencial.

No mês passado, quando a cidade de Petrópolis foi arrasada pelas chuvas e inúmeras casas foram soterradas pela lama das encostas, esses cães conseguiram localizar mais da metade das vítimas (de um total de 232), algumas com vida. O trabalho desses animais é de tamanha importância que eles sãos os primeiros a chegar e os últimos a sair.

Em Brumadinho, em 2019, quando a barragem da Vale se rompeu e um “tsunami” de lama arrastou 270 pessoas para a morte, esses cães, junto de seus bombeiros condutores –nome do profissional que atua junto ao cão farejador– trabalharam incansavelmente por meses e meses para encontrar as vítimas. Até hoje, um grupo de bombeiros atua na cidade para localizar as últimas seis vítimas.

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Treinamento

O treinamento para transformar um cão em um farejador de pessoas (vivas ou mortas) começa desde filhotinho, com apenas 45 dias de vida. E as raças mais indicadas para esse ofício labrador, pastor alemão, golden, boxer e collie.

Em meio às calamidades, eles surgem para ajudar. Foto / Redes sociais/Reprodução

Mas isso não é regra, como prova o vira-lata Resgate, que morava nas ruas de São Paulo e foi encontrado por seus tutores em uma caçamba de lixo. Ao perceberem o talento nato do cachorro para farejar –motivo da origem do nome–, seus donos investiram nisso e esse vira-lata acabou fazendo parte do grupo “Resgate Sem Fronteiras”, que atua em catástrofes e apoio animal e colaborou muito nas buscas em Brumadinho.

A regra também diz que, para conduzir um cão de busca e salvamento, o militar precisa passar por um treinamento básico de adestramento para dar os comandos básicos como “senta, deita, fica” e outros mais específicos. Na verdade, o animal pertence ao Governo do Estado, mas o militar é responsável por ele e por seu treinamento. No caso dos cães farejadores de pessoas (existem também os que farejam drogas e explosivos), eles são apresentados a cada tipo de odor e estimulados a identificá-los, sendo que o treino deve ser o mais parecido possível com as situações reais.

E aí você pode estar se perguntando (como eu me perguntei): mas como treinar um cachorro para sentir o cheiro da carne de um ser humano morto? Pois é, em alguns estados é permitido fazer treinamento com o uso de carne humana e, naqueles que são proibidos, eles usam produtos químicos com cheiros similares. Nem me pergunte quais estados permitem isso porque eu não pesquisei, não tive coragem…

É claro que esses bombeiros acabam se apegando –e muito– aos cães que treinam e com os quais trabalham durante anos. Essa cumplicidade, essa sintonia entre o condutor e o animal, às vezes é tão grande que, quando o cão fareja algo, ele nem late (o que é normal acontecer), ele simplesmente troca olhares com o seu condutor, que entende perfeitamente a mensagem.

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40 vezes mais

Esse trabalho de cão farejador se deve ao olfato do cachorro ser 40 vezes mais sensível que o do ser humano. Além de identificar vários cheiros e odores, os cães conseguem fazer isso de muito longe, mais de 15 metros de distância.

Nas calamidades, para facilitar o trabalho desses animais, os bombeiros entram no local e começam abrindo caminho e usando hastes para fazer dezenas de buracos no terreno, o mais fundo possível, para só então soltarem os cães.

Uma curiosidade sobre o trabalho do cão farejador é que ele deve trabalhar com a boca fechada para que seu olfato fique ainda mais apurado. Quando ele começa a abrir muito a boca, é sinal de que está ficando cansado, e a norma diz que, para cada 10 minutos de trabalho desses cães, 20 devem ser de descanso, a não ser que o animal esteja no meio de uma descoberta. Aí, ele mesmo quer ver o serviço chegar ao fim.

Cão farejador trabalhando para encontrar vítimas em Petrópolis. Foto / Redes sociais/Reprodução

Quando vejo os cães farejadores em ação, me vem à mente uma reportagem que vi na época (entre inúmeras), sobre o atentado de 11 de setembro de 2001 nos Estados Unidos. A última sobrevivente foi retirada dos escombros do World Trade Center no dia seguinte aos ataques. Depois disso, ninguém mais foi encontrado com vida, o que acabou estressando muito os cães farejadores de pessoas vivas, que simplesmente se sentiram fracassados na função para a qual foram designados. Que tristeza…

Por levarem tão a sério o trabalho, esses animais merecem todo o nosso respeito e consideração. São verdadeiros heróis que, muitas vezes, acabam dando a própria vida para fazer um resgate. Realmente, há sempre um ar de tristeza onde esses animais trabalham, mas com certeza eles também são responsáveis pela felicidade de muita gente e, mais do que isso, por trazer muitos de volta à vida.

Adote

> Edna Petri é jornalista (MTb nº 13.654) há 39 anos e pós-graduada em Comunicação e Marketing. Mora na Vila Ema há 20 anos, ama os animais e adora falar sobre eles.

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