Foto / Vivão e Vivendo/Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

− Largue disso, rapaz, você soca o pilão muito devagar. Olhe como se faz!

E a idosa senhora pegava na pesada mão do pilão e piloava com muito vigor, em golpes rápidos. Inacreditável, melhor que os homens que a cercavam, jovens, que não conseguiam esse ritmo dinâmico.

Tudo para produzir uma deliciosa paçoca caipira para comer na Semana Santa. Iguaria brasileira, aqui no estado de São Paulo, notadamente no Vale do Paraíba, é largamente apreciada, sem ela não há boa Páscoa.  Feita basicamente de amendoim, farinha de milho em flocos, açúcar, pitada de sal e um pouco de farinha de mandioca, num processo rudimentar, consegue-se este doce saboroso.

A elaboração raiz, que acompanhei muitos anos atrás, por muitas vezes começa com a torra dos grãos de amendoim, ainda com casca, na panela. Depois parte-se para a retirada das cascas com o uso daquelas peneiras circulares de palha, esfregando o amendoim e jogando-o para o alto, assoprando para fora as casquinhas voadoras.

Gente, a peneira era aquela mesma que o Pedrinho do Sítio do Pica-Pau Amarelo usava para caçar o Saci, artifício aprendido do velho e sábio Tio Barnabé!

Pronto o amendoim, cascado como diria o caipira, arranja-se tudo no pilão de madeira, grande, de cerca de oitenta centímetros de altura. Hoje é até difícil encontrar um, mas se acha até de madeira de lei, para enfeite.

Com o amendoim se adiciona o açúcar, a farinha de milho e toca a socar, socar, tarefa um tanto cansativa, só quem fez sabe. Mas tem técnica. Em meio ao processo se coloca a pitada de sal e a farinha de mandioca. E se obtém, após um suadouro, a formidável paçoca. Cheirosa, irresistível.

Come-se de várias maneiras, pura ou como acompanhamento de outros alimentos, principalmente com banana. Prefiro a minha purinha.

PUBLICIDADE

As pessoas mais jovens, e isso já havia na minha distante infância, se acostumaram a saborear a paçoca industrializada.  A gente comia aquelas paçoquinhas de pacotinho compradas diariamente nas vendas, mercearias e bares, em meio a marias-moles, doces cristalizados, balas e chicletes. Essas paçoquinhas, contudo, eram muito fininhas e açucaradas, viciando o paladar da moçada.

Ao ingerir a paçoca raiz, muitos estranham a sua consistência, mais grossa, devido a seus ingredientes, principalmente a farinha de mandioca. Por essa razão, os atuais produtores artesanais fazem mais de um tipo de paçoca, uma que chamam de farinha de milho, outro de mandioca, outra mais molhadinha, com mais amendoim, para acalmar o gosto distorcido dos consumidores em vista da paçoca industrial.

De qualquer maneira, todas são boas. Costuma-se comprar boa paçoca nas feiras de São José dos Campos, compro a minha na feira da sexta, na região da Vila Jaci-Vila Ema. Ou no Mercado Municipal, a excelente produzida pelo amigo Alemão. Semana Santa sem paçoca –perdoe-me Senhor– fica um tanto capenga, exigindo mais reza.

Mesmo já passada a Páscoa, continuo a comer diária e impunemente a minha paçoca, até acabar a quantidade comprada na feira. Só não quero mais ouvir a admoestação da zelosa e eficiente paçoqueira –não por acaso, a minha saudosa sogra:

− Zéroberto, você piloa devagar, sem força. Assim vai levar um ano para acabar essa paçoca!

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

PUBLICIDADE
PUBLICIDADE
PUBLICIDADE