Estou à caça do livro “Nossa Cidade de São José dos Campos”, do Jairo César de Siqueira. Numa dessas, fui parar num sebo do Largo São Miguel, no centro. Estacionei bem ao lado da cruz. Olhei os degraus com cera de velas derretidas, a fachada da capelinha (construída em 1863) que leva o nome do santo razoavelmente bem conservada e, emoldurando a cena, lá atrás, o edifício Cinelândia, meio caído, feioso.
Imediatamente veio a lembrança de quando morava na Francisco Paes, ali perto, e olhava para aquele prédio que me remetia a um transatlântico. Imagine! Um navio enorme no centro da cidade. Mas era a minha percepção de criança, uma das vistas que tinha do quintal da casa do meu avô (onde meu pai construiu nossa casa). O quintal era maravilhoso. Muitas árvores, entre elas uma jabuticabeira que ainda resiste nos fundos do estacionamento em que tudo se transformou hoje.
Enquanto esperava o funcionário do sebo procurar o livro, bateu aquela nostalgia, lembranças do final da década de 60, início de 70. A loja do Perotti na esquina da Floriano Peixoto e Francisco Paes. Eletrodomésticos em geral e até algumas motos Jawa, uma miscelânea.
Seguindo um pouco mais, o famoso Bar do Pedro, reduto da boemia joseense, onde meu pai ia tomar cerveja com amigos. De vez em quando se cansava um pouco da mesma turma e trocava pelo bar do japonês, na Floriano Peixoto. O dono adorava turfe e as paredes do boteco tinham desenhos de cavalos de corrida. Achava o máximo!
Do outro lado da rua, a bicicletaria do japonês (não lembro o nome dele), que eu frequentava diariamente com meu irmão Paulo. Ao lado, o salão de beleza do Nakamura e a farmácia São Miguel, já na esquina do Largo. Ah, e tinha a Zoraide, famosa por seus pastéis, que morava perto da capela.
Seguindo, na outra esquina, a Papelaria Guanabara bem em frente à Praça do Sapo. Mais um pouco, na Rubião Júnior, a concorrente Dartec, e o cartório da minha tia Célia, cuja casa era no atual terreno do Shopping Centro, na mesma rua.
Retorno para a Francisco Paes. Anos depois, o edifício Jerônimo Carnevalli foi erguido onde meu tio Chico (o primeiro dentista da cidade) tinha uma linda casa de esquina. Não me chamava tanto a atenção como o ‘transatlântico’ da rua 15 de Novembro.
Nas lojas que se instalaram na área comercial do prédio, destaque para A Esportiva, do ‘seu’ Idemauro. Em 1973, a inauguração da Lojas Americanas, que frequentava diariamente com meus amigos. Saudades da lanchonete, daquele sundae de chocolate delicioso, do cachorro-quente com molho caprichado e da pizza vendida em pedaços.
Volto para 2021, entro no sebo e nada do funcionário localizar o livro. “Tenho certeza que está aqui, quando eu encontrar, ligo pro senhor”, disse, se desculpando pela demora.
Que nada, foram minutos deliciosos em que viajei no meu ‘transatlântico’ pelo oceano das memórias.
> Henrique Macedo é jornalista (MTb nº 29.028) e músico. Mora há 40 anos na Vila Ema.