Foto / Edward Lich / Pixabay

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Deltan Dallagnol, ex-procurador da República –e responsável do Ministério Público na Operação Lava Jato–, que foi eleito deputado federal mais votado do Paraná, com quase 345 mil votos, teve seu registro de candidatura cassado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e, consequentemente, perderá seu cargo.

Mas, afinal, o TSE agiu corretamente sob a análise estritamente jurídica? Há controvérsias e vamos explicar, de forma bem resumida, para você entender direito.

O julgamento ocorreu sobre análise de recursos interpostos pelo Partido da Mobilização Nacional (PMN) e pela federação Brasil da Esperança, que conta com o PT, contra acórdão do Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) que havia deferido o registro de candidatura do político.

A tese da acusação alegou que Dallagnol estaria inelegível por requerer exoneração do cargo de procurador da República enquanto estavam pendentes as análises de reclamações disciplinares, sindicâncias, pedidos de providências e Processo Administrativo Disciplinar (PAD), o que atrairia as inelegibilidades descritas no artigo 1º, inciso I, alíneas “g” e “q”, da Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar nº 64/90), introduzidos pela Lei da Ficha Limpa (LC nº 135/2010), no sentido de que os candidatos sejam suficientemente probos e estejam aptos a exercer cargos eletivos.  Portanto, no ato de registro de candidatura, ele estaria inelegível.

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Para os que são contra a cassação

Os contrários à cassação alegam que a hipótese de inelegibilidade prevista na Lei da Ficha Limpa serve para casos de ex-integrantes do Ministério Público ou do Judiciário que tenham deixado o cargo com pendência de processo administrativo disciplinar (PAD), sendo que, no caso do ex-procurador, não havia nenhum PAD aberto quando ele pediu exoneração em novembro de 2021, mas apenas apurações preliminares em curso no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Dois PADs de mera advertência e censura estavam terminados.

Para os que defendem a cassação

O voto condutor do julgamento, que obteve unanimidade dos juízes, do ministro Benedito Gonçalves, mostra a tese da “fraude à lei”, caracterizada “pela prática de conduta que, à primeira vista, consiste em regular exercício de direito amparado pelo ordenamento jurídico, mas que, na verdade, configura burla com o objetivo de atingir a finalidade proibida pela norma jurídica”.

O julgamento alegou que Deltan Dallagnol antecipou sua exoneração a pedido para evitar sua demissão e para que, se as apurações preliminares evoluíssem para processos administrativos, elas não causassem sua efetiva inelegibilidade. Corrobora esta tese o fato de a exoneração ter sido requerida 11 meses antes das eleições, sendo que os membros do MP apenas precisam se afastar do cargo faltando seis meses para o pleito (artigo 1º, II, “j”, da LC 64/90).

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A discussão jurídica 

A questão jurídica é, portanto, se deveria ser aplicada a lei restritiva e objetivamente, ou se a interpretação extensiva pela “fraude à lei” teria lugar. Há defesa para os dois lados, mas a verdade é que os tribunais superiores sempre trouxeram uma carga política e, no caso, não é diferente.

Quem é partidário da Operação Lava Jato e do modus operandi dos seus membros, principalmente do ex-procurador Deltan Dallagnol e do ex-juiz Sergio Moro, a visão será mais legalista.

Ao contrário, seus detratores ou os juristas com uma visão mais ampla e pela analogia, com uma interpretação elástica, entendem que o julgamento do TSE foi perfeito, pois, afinal, há uma presunção de que aquele que se exonera no curso de um procedimento que pode levar a uma punição, provavelmente o está fazendo para se furtar a ser investigado –e punido, como já ocorreu diversas vezes no Brasil, principalmente no meio político.

Fato é que está havendo uma politização do judiciário e uma judicialização da política. Sou a favor de operações como a Lava Jato, mas sempre fui crítico do modo de agir dos seus agentes e julgadores, com claros excessos. Não acho que os fins justificam os meios, alertei há muito tempo que tudo poderia ser questionado no futuro por questões processuais procedimentais, como ocorreu.

Entendo que a decisão do TSE foi tecnicamente correta, pois defendo uma aplicação ampla do Direito –e existiram no caso outros indícios e agravantes–, mas tenho convicção de que se o acusado não fosse quem foi o julgamento provavelmente teria tido outro desfecho.

 

> Eduardo Weiss é jurista, advogado, professor, palestrante e autor. É Doutor em Direito Internacional e Mestre em Direito das Relações Econômicas Internacionais pela PUC-SP.

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