Foto / Divulgação/instagram.com/jogosolimpicos/

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

O tema é recorrente nos cursos, palestras e orientações dos profissionais que cuidam de saúde mental como um salvo conduto para a pessoa não perder o contato consigo mesma. Estar “presente” de corpo e alma em cada momento da existência, praticar exercícios, fazer uma atividade manual, cuidar das plantas e dizer NÃO para tudo que não respeita o ser, nossos valores, crenças e limites.

Isso deveria ser fácil e orgânico, mas não tem sido, pra muita gente, ou quase todo mundo.

Antes de continuar, já aviso e me desculpo: não tenho nenhuma credencial para tratar do assunto, só curiosidade mesmo e a constatação do quão difícil esse exercício é, cada dia mais. Pressões psicológicas de todos os tipos nos espremem e não precisa ser Simone Biles, uma rainha da ginástica, coberta por medalhas, para sentir a cobrança de atender as expectativas dos outros.

Uma cobrança que atinge a todos, independentemente de gênero. Estar lindo, ter sucesso profissional, colecionar prêmios, seguidores, likes; as falhas da pele escondidas por um make irretocável, as marcas internas disfarçadas pelo sorriso fake. Comportamentos tão corriqueiros que acabam vistos como normais.

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E aí chega Simone Biles e diz: não.

A coragem de desistir e sair da disputa de finais para as quais trabalhou intensamente talvez tenha sido a principal vitória da grande campeã, nesse mundo em que reconhecer limitações humanas não parece opção.

Não vou mentir. Minha primeira reação foi pensar: — Por que ela não desistiu antes e cedeu a vaga? Depois fiz o “mea culpa”. Quem sou eu pra julgar o momento de Simone Biles e quais caminhos ela trilhou pra chegar até esse ponto? O que é que eu sei de você, o que de fato você sabe de mim e o que sabemos dela?

Observando com mais cuidado a rapaziada que está por aí encontrando novos caminhos profissionais, abrindo empresas disruptivas e, tantas vezes, incompreendidas inicialmente, valorizando o próprio tempo, me leva a pensar que Biles é parte de um movimento maior de uma turma que, mesmo a duras penas e muito julgamento, é capaz de ligar o f… e dar mais atenção a si mesma e ao que precisa em lugar de seguir um modelo engessado de ser para agradar.

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Certamente não nascemos para cumprir tanto horário, tanta regra, burocracia, que tantas vezes violentam a condição de ser humano para agradar quem quer que seja. Ser coerente e fiel às coisas que acreditamos de verdade ou apenas reconhecer o que mais precisamos para um determinado instante da vida, quase sempre tem um preço alto.

A decisão de dizer “não” revela o tamanho da coragem dessa moça, mais do que tudo que ela já realizou. Fico na torcida para que os responsáveis pela equipe da qual ela faz parte tenham um olhar humanizado para entender o pedido de respeito que a ocasião pede e estender esse olhar para o futuro.

Por princípio, sou contra a alimentação de expectativas, mas, lá no fundo, tenho agora um broto de esperança, nesse terreno tão árido, de que essa turma revolucionária do “ser” vá ganhando espaço para além dos likes. Já passou muito da hora.

 

> Maria D’Arc Hoyer é jornalista (MTb nº 23.310) há 28 anos, pós-graduada em Comunicação Empresarial. Mora na região sudeste de São José dos Campos. É autora do blog recortesurbanos.com.br.