Quantos “Gareth Jones” estarão espalhados pela Ucrânia neste momento? Jornalistas à procura da verdade, tropeçando em roupas, malas, brinquedos, talvez em corpos e mãos sem gênero nem idade, implorando por água e comida… Profissionais registrando, na mente e nos equipamentos de trabalho, esses milhões de restos de vida destruídos pela insanidade de um governante.
“A Sombra de Stalin” (Mr. Jones) nos mostra que, em 1933, a então União Soviética, sob o regime de Josef Stalin, havia vitimado milhões de ucranianos. Baseado em fatos reais, a diretora Agnieszka Holland (“Filhos da Guerra”, “O Jardim Secreto” e alguns episódios das excelentes séries “The Affair” e “House of Cards”) nos traz o jornalista galês Gareth Jones (James Norton: “Adoráveis Mulheres”, “Hampstead: Nunca é Tarde Para Amar”), que revelou em primeira mão o genocídio que ocorria na Ucrânia sob a utopia soviética stalinista que era exibida ao mundo.
Aluno brilhante do idioma russo na Universidade de Cambridge, o assessor do ex-primeiro ministro britânico David Lloyd George (Kenneth Cranham: “Um Bom Ano”, “Malévola”, “Operação Valquíria”) se lança ao jornalismo freelance com sua câmera à mão e parte em busca da verdade.
A reconstrução de época e o uso de cenários quase sem cor beiram a perfeição: nos fazem tremer de frio e de revolta ao ver adultos, crianças e idosos esquálidos morrendo de fome como (e com) animais pelas ruas e estradas da Ucrânia.
Outro personagem que tem papel fundamental –e fez parte da História– é Walter Duranty (Peter Sarsgaard: “Sete Homens e um Destino”, “A filha Perdida”, “Blue Jasmine”), o correspondente antiético e excêntrico que, da sucursal do “The New York Times” em Moscou, omite do mundo a realidade soviética. A também jornalista em Moscou, Ada Brooks (Vanessa Kirby: “Pieces of a Woman”, “O Mestre dos Gênios”. Série “The Crown”), torna-se amiga íntima de Gareth Jones e revela a repressão violenta que está por trás do regime.
Criativa e oportuna a ideia da roteirista Andrea Chalupa de introduzir cenas fictícias com o escritor George Orwell (Joseph Mawle: “No Coração do Mar”, “Busca Implacável”) que, de defensor cego de Stalin, muda radicalmente ao se ver diante do testemunho de horror trazido pelo jovem jornalista e começa, então, a escrever “A Revolução dos Bichos”, obra que se tornou símbolo da crítica ao stalinismo.
Imperdível para quem gosta de História, jornalismo, política, cultura, pois são múltiplas as áreas que circundam esse ótimo filme; acima de tudo, nos leva a refletir sobre o passado, mantendo os olhos e ouvidos no presente. Disponível na Netflix.
Série
“Um Lobo Como Eu”
Eis uma boa mistura de romance e comédia, com uma dose de suspense. Viúvo há alguns anos, Gary (Josh Gad: “Quatro Vidas de um Cachorro”, “Marshall: Igualdade e Justiça”) continua inconsolável e se dedica integralmente à filha Emma (Ariel Donoghue: “Tough”, “Blueback”). A menina sofre de ataques de pânico –que desencadeiam crises de asma–, faz terapia, mas mantém um relacionamento muito difícil com o pai.
Atrasado como de hábito, a caminho da escola com a filha, um acidente de trânsito –ou o Universo?!?– os apresenta Mary (Isla Fisher: “Truque de Mestre”, “O Grande Gatsby”), que possui um segredo guardado a sete chaves. Gary experimenta novos sentimentos e Emma, inacreditavelmente, se deixa aproximar de uma estranha depois de muitos anos, que consegue acalmá-la no momento de crise ocasionada pelo acidente.
Uniões improváveis, pesadas bagagens de vida, “Wolf Like Me” se passa em Adelaide, na Austrália, com filmagens em New South Wales. Entretanto, as cenas de tirar o fôlego, nos episódios finais da primeira temporada, são de Broken Hill, cidade mineira cujos arredores são conhecidos por seus “outbacks” que impressionam pela beleza.
Junte a família, prepare a pipoca e maratone! Os episódios são curtos e estão disponíveis na Amazon Prime Video.
> Tila Pinski é jornalista (MTb 13.418/SP), atua como redatora e revisora de textos, coordenadora editorial e roteirista. Cinéfila, reside há dez anos na Vila Ema.