Bolsa Família em 2023: 21,45 de famílias beneficiadas, com valor médio de R$ 688,97 mensais por família. Foto / Ana Nascimento/Agência Brasil

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Governo federal destaca avanços obtidos pelo Bolsa Família, programa de transferência de renda que chega aos 20 anos com um novo desafio: voltar a retirar o país do Mapa da Fome, da ONU

 

DA REDAÇÃO*

A cerimônia de celebração dos 20 anos do Bolsa Família foi realizada nesta sexta-feira (20) no Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS), em Brasília. O programa público de transferência de renda, criado em 20 de outubro de 2003 e coordenado pelo MDS, busca integrar políticas públicas, facilitando o acesso das famílias a direitos básicos como saúde, educação e assistência social.

A cerimônia teve a participação, por videoconferência, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em cujo primeiro ano de mandato o programa foi criado. O presidente se recupera de cirurgia na residência oficial, no Palácio da Alvorada. Em seu discurso, Lula reforçou a importância da distribuição de renda para o desenvolvimento do país e para a melhoria da qualidade de vida das pessoas.

O primeiro pagamento do Bolsa Família foi realizado em outubro de 2003 e contemplou 1,15 milhão de famílias. Cada família recebeu, em média, R$ 73,67. As metas de superação da pobreza e transformação social foram os alicerces de criação do Bolsa Família, que unificou o pagamento de diversos benefícios de governos anteriores em um só programa.

Dados do Instituto Mobilidade e Desenvolvimento Social, citados pelo MDS, apontam quem mais de 64% das crianças e adolescentes que recebiam o Bolsa Família em 2005 deixaram o Cadastro Único até 2019, com a inserção desse público no mercado formal de trabalho.

Mapa da Fome

Lula reafirmou o compromisso de tirar novamente o Brasil do Mapa da Fome das Nações Unidas. O país havia saído dessa estatística em 2014, por meio de estratégias de segurança alimentar e nutricional executadas ao longo da década anterior, mas voltou a figurar no cenário nos anos seguintes, especialmente no período da pandemia de covid-19.

Dados do relatório global Estado da Segurança Alimentar e Nutrição no Mundo, divulgado por cinco agências especializadas da ONU (Organização das Nações Unidas), apontam que um em cada dez brasileiros (9,9%) passava por situação de insegurança alimentar severa entre 2020 e 2022.

Além disso, segundo o mesmo estudo, quase um terço (32,8%) da população do país está incluído nas categorias de insegurança alimentar severa ou moderada, o que equivale a 70,3 milhões de brasileiros. A situação mostra um agravamento no acesso à segurança alimentar no país. Os dados anteriores, de 2014 a 2016, indicavam percentual de 18,3%.

“A gente não tem que falar em gasto quando se trata de combater a fome, de melhorar a educação, a saúde, quando se trata de investir no trabalho daqueles que cuidam desse país, que cuidam do nosso povo e que cuidam das nossas crianças”, disse Lula. “A coisa mais barata que tem no Orçamento da União é cuidar do povo pobre, é cuidar das nossas crianças.”

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Efeitos positivos

Pesquisa conduzida pelo Banco Mundial também mostra efeitos positivos do programa Bolsa Família nas atividades econômicas locais, com aumento no consumo, nos empregos, no número de contas bancárias e na arrecadação de impostos nos lugares onde o programa se expandiu de forma mais consolidada.

Outro estudo, realizado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e Banco Mundial, em parceria com o MDS, aponta que 3 milhões de famílias beneficiárias do programa deixaram a pobreza neste ano. A linha de pobreza considerada no estudo é o valor de R$ 218 mensais per capita.

Não há ninguém no Bolsa Família em condição de pobreza extrema, ou seja, com renda per capita abaixo de R$ 109, já que o valor mínimo é de R$ 142 por pessoa da família, e de R$ 600 por família.

As mulheres são as principais responsáveis familiares no Bolsa Família. Em outubro, somam 17,79 milhões, o que equivale a 82,9% do total. Dados do MDS mostram ainda que a maioria das famílias são monoparentais femininas com filhos (independentemente da idade dos filhos), que somam em outubro 10,76 milhões (50,16%). Outra predominância diz respeito aos pretos ou pardos, que respondem por 73% do total de beneficiários.

Neste mês, 21,45 milhões de famílias de todos os 5.570 municípios brasileiros estão recebendo Bolsa Família. O cronograma de repasses é escalonado e tem por base o final do número de identificação social (NIS) de cada integrante. Os pagamentos começaram no dia 18 e seguem até o dia 31. O valor médio do benefício pago em outubro é de R$ 688,97.

Novo Bolsa Família

Um dos objetivos do novo Bolsa Família, relançado no mês de março deste ano, é ampliar a proteção a crianças e adolescentes e ser capaz de dar atenção proporcional às diferentes composições familiares. Durante o governo Jair Bolsonaro (PL), o programa de transferência de renda foi chamado de Auxílio Brasil.

No mês em que completa 20 anos, o MDS reforçou o programa e implementou o adicional para mães de bebês de até seis meses de idade. Chamado de Benefício Variável Familiar Nutriz, o adicional corresponde a seis parcelas de R$ 50 para garantir a alimentação da criança.

Com isso, o governo fechou o ciclo de modernizações do programa. Além do novo adicional, o programa paga um acréscimo de R$ 50 a famílias com gestantes e filhos de 7 a 18 anos, e outro, de R$ 150, a famílias com crianças de até 6 anos.

O novo Bolsa Família possui ainda uma regra de proteção para aqueles que conseguem emprego. Pelas regras, é permitida a permanência de beneficiários no programa para famílias que elevam a renda até o patamar de meio salário mínimo por integrante do núcleo familiar. Nesse caso, elas recebem 50% do valor total do benefício. Em outubro, a regra de proteção alcança 1,97 milhão de famílias.

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Contrapartidas

O novo Bolsa Família também retomou os parâmetros desenhados no primeiro governo do presidente Lula, quando foi criado, em 2003. O principal deles é a exigência de contrapartidas das famílias beneficiadas, como a obrigação do acompanhamento pré-natal para gestantes e do estado nutricional das crianças menores de 7 anos.

Também é exigida a atualização da caderneta de vacinação com todos os imunizantes previstos no Programa Nacional de Vacinação, do Ministério da Saúde. As famílias devem, ainda, garantir a manutenção da frequência escolar das crianças e adolescentes, de 60% para crianças de 4 a 5 anos e de 75% para beneficiários de 6 a 18 anos que não tenham concluído a educação básica.

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DEPOIMENTO

Psicóloga que conseguiu sair do Bolsa Família conta a sua história

Ex-beneficiária do Bolsa Família, a psicóloga Raquel contou sua história durante cerimônia comemorativa dos 20 anos de criação do programa. Foto / Marcelo Camargo/Agência Brasil

“Um dia eu precisei do Bolsa Família, e hoje não preciso mais”, disse a psicóloga Raquel Lima Clemente, ex-beneficiária do programa, durante a cerimônia de celebração dos 20 anos do Bolsa Família. Moradora do Espírito Santo ela contou como a educação e a renda garantida pelo programa mudaram a vida da sua família.

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“Sou psicóloga formada pela Universidade Federal do Espírito Santo, mas nem sempre foi assim. Quando eu tinha 10, 12 anos, precisei trabalhar em casa de família para ajudar minha mãe, ajudar meus pais com verba e eu não tive oportunidade de estudar”, disse, explicando que, “nos atropelos”, chegou ao ensino médio, mas precisou parar os estudos. Em 2010, voltou para a sala de aula e em 2018 concluiu o curso superior.

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O Bolsa Família entrou na vida dela antes disso, quando tinha três dos seus quatro filhos ainda pequenos, o marido desempregado e a família em dificuldade financeira. “Eu pensei comigo: não posso cometer com eles a injustiça que eu achei que foi cometida comigo. Eu não posso pegar eles e colocar para trabalhar. Eu tenho que priorizar a educação”, relembra.

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“Fui contemplada com Bolsa Família, então não precisei pegar o tempo da tarde deles e colocar para trabalhar. Eles podiam, no tempo da tarde, ser crianças, porque criança precisa brincar na rua, subir em pé de árvore e outras coisas. Eles podiam fazer os trabalhos, estudar para as provas”, disse, explicando que priorizava a compra de material escolar com o benefício.

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“Eles não precisavam trabalhar para me ajudar porque eu tinha o Bolsa Família. Eu plantei uma semente quando fiz isso porque hoje tenho dois filhos engenheiros, todos formados pela Universidade Federal do Espírito Santo.”

 

*Com informações da Agência Brasil.