Foto / Google/Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Nunca me esqueci daquela tarde em que fomos à Vila Ema e ficamos cobertos de lama. Aí está um exemplo de como a juventude sempre anda despreocupada, dando trabalho para os anjos da guarda.

Foi em 1966, papai tinha dois carros, um deles um Ford Prefect velho que nunca pegava na partida, a sorte era que morávamos na ladeira da rua Carvalho de Araújo, Vila Maria, antiga São José dos Campos. Para conseguir rodar −nesta minha única opção de andar de carro− era entrar nele, ligar, descer a ladeira com a segunda marcha engatada e pegar no tranco. O motor de arranque nunca funcionava.

Além disso, o freio era o antigo sistema a varão. Explicação necessária aos mais jovens: não era hidráulico, era mecânico, e dependia da força que o motorista imprimia no pedal para empurrar os varões e pressionar o tambor de freio. Em suma, funcionava pisando forte no breque e rezando para que o carro parasse. Esse automóvel era do tempo em que as velocidades dos veículos eram baixas, como as bicicletas, sendo suficiente a força mecânica dos varões. Contudo, queríamos andar depressa: que sufoco!

Como se não bastasse, a primeira marcha não era sincronizada, para colocá-la tinha de praticamente parar o carro ou engatar no tempo, como se dizia. As outras também eram difíceis, exigiam certa habilidade. E como era feio o tal carrinho! Parecia um armário com rodas, porém era o que me permitia rodar um pouco.

Voltando à lama, naquele dia de verão, estava levando para casa o Marinho Simões e o Nelsinho Praça, depois de estarmos em casa, com meu pai, irmãos e amigos, a jogar animadas partidas de buraco. Ambos eram moradores da então distante Vila Ema, que já tinha, como o Jardim Maringá, linhas de ônibus. No entanto, rodando na terra nua a partir da Faculdade de Direito. A região não era exatamente nobre como nos dias atuais.

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Um dos seus acessos era a avenida São João, sem o atual alargamento a partir da Prudente Meirelles de Moraes. Quando chegamos ao lado do antigo Sanatório Vicentina Aranha, com aquele muro feioso, a avenida era um barro só.  Lá fui deslizando com o tal armário em forma de carro, para o divertimento dos dois passageiros, que então resolveram reivindicar o direito de dirigir um pouco. Deixei, vai. Mas que horror, eles não eram muitos chegados ao volante e as condições, do veículo e do terreno, eram totalmente desfavoráveis. Nós três ríamos muito com o trajeto na lama, deslizando para cá, deslizando para lá. Não sei como o guarda-roupas não tombou e não sofremos um acidente.

Mas aconteceu o previsível: o bendito carrinho morreu no meio da lama e não dava partida. O jeito era empurrar o glorioso Prefect no barro para fazê-lo funcionar, sem a ajuda de seu inútil motor de arranque.  Eu também empurrava, de porta aberta e quando pegava alguma velocidade pulava no banco e tentava pegar o bicho no tranco. Tentamos várias vezes até conseguir. Nesta altura só não tínhamos barro nos olhos!

Foi difícil, porém chegamos à tal Vila Ema, embora devidamente enlameados dos pés à cabeça: involuntária cobertura de chocolate. Aventura perigosa, tragicômica, numa São José que na época não tinha nem ao menos um parque público para a diversão da juventude.

Só não sei por que os amigos não mais me pediram carona para voltar para casa… iam nos ônibus da São Bento. Talvez tenham gostado da farra, porém não ao ponto de repeti-la.

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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