Ufa… O Brasil acordou nessa segunda-feira, dia 13, um pouco mais aliviado. Parece que vamos poder, enfim, cuidar das nossas vidas, do nosso dia a dia, sem a sensação de um fuzil nas nossas costas.
Depois de uma escalada das tensões de uns meses para cá, de uma sensação de fim do mundo com manifestações pró Bolsonaro (no dia 7 de setembro) e contra (no dia 12), passamos por isso e o ar se tornou mais respirável.
Não se sabe o que vai acontecer daqui por diante, mas espera-se que todos os atores desse drama que é a política brasileira voltem suas atenções para a governabilidade do país e para o combate aos nossos problemas mais urgentes, como o golpe de misericórdia no novo coronavírus e um ataque impiedoso ao monstro da inflação.
Enquanto o clima não esquenta novamente, aí já na pré e na campanha eleitoral do ano que vem, talvez valha a pena uma reflexão sobre os motivos que nos levaram a uma crise institucional tão profunda. Ao mesmo tempo, também vale a pena um exercício de imaginação na busca de soluções para oxigenar o Brasil, olharmos para frente e não voltarmos a viver esses impasses.
Como chegamos aqui?
– Já faz muito tempo que a Educação foi relegada a um segundo plano no Brasil. Não se estuda mais como antigamente, na base a progressão é automática, no ensino médio exige-se pouco e, nas faculdades, tem gente cursando ensino superior via celular. É preciso redefinir tudo isso. Como disse o ministro da Educação, sem saber se comunicar e por isso foi mal compreendido, o país precisa muito de bons técnicos, daí a importância de bons cursos que levarão os alunos formados diretamente para bons empregos. Já o curso superior deve exigir muito mais dos estudantes para que, com o diploma nas mãos, sejam mais capazes intelectual e profissionalmente. Ou seja, o brasileiro tem que ser mais educado, culto e preparado para lutar por suas ideias.
– A classe política brasileira deixou há muito tempo de usar o lema “do povo, para o povo e pelo povo” e instalou-se no poder como se não tivesse contas a prestar à sociedade, que é a razão da sua existência. Os partidos políticos perderam identidade e não representam mais as correntes de pensamento da sociedade. Escândalos inacreditáveis envolvendo corrupção na vida política deixaram uma sensação clara de impunidade, que passou a levar a população a defender soluções extremas e radicais.
– Os Poderes da República –Executivo, Legislativo e Judiciário– se apequenaram. O Executivo governa pouco e quase sempre mal; o Legislativo se concentra mais nas suas questões internas e corporativistas do que na função de propor leis ouvindo o cidadão, aprová-las rapidamente e fiscalizar a sua aplicação; e o Judiciário, igualmente corporativista, cede à tentação de se intrometer no funcionamento dos outros dois Poderes, com olhos mais voltados às questões políticas do que ao cumprimento das leis.
– O cidadão comum, que não é tão comum assim porque é o “patrão” de todos os integrantes dos três Poderes, como quando se diz que “todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido” (adaptação do artigo 1º da Constituição), perde o ânimo, a confiança e a esperança…
– Quando vê o Executivo não fazer nada em um momento em que os preços dos alimentos básicos sobem à estratosfera, os desmatamentos se alastram, o desemprego se agrava, ou a Saúde fica à mercê de interesses políticos e ideológicos;
– Quando vê deputados e senadores não transformar em leis as demandas da sociedade na busca por mais justiça social, leis mais duras contra os crimes e mais respeito ao dinheiro público;
-Quando vê juízes de todas as instâncias decidirem de acordo com suas convicções pessoais em processos que levarão décadas para serem julgados caso os réus possuam recursos, ou praticantes de crimes de morte irem até a delegacia e saírem horas depois pela porta da frente enquanto o cadáver de suas vítimas ainda está quente.
Em um quadro desses, que não muda ao longo pelo menos dos últimos 20 anos, seria até estranho se a população brasileira não se revoltasse. Daí a surgirem os extremos, os radicalismos, as ideias malucas, é só um passo. Quando poderia ser considerado normal “fatias” de no máximo uns 10% de radicais de esquerda e mais 10% de radicais de direita, nas pontas de uns 80% da população trafegando entre a centro-direita, o centro e a centro-esquerda, quando tudo parece em crise e os Poderes não respeitam a sociedade, aí muita gente menos radical desliza para um dos dois extremos da “régua” ideológica: ou 8 ou 80. É o que estamos vivendo agora no Brasil.
Como sair daqui?
Entre as principais medidas que podem arrumar a casa brasileira, pense em uma só ocupando os primeiros lugares: ouvir e respeitar o povo. Está faltando isso. Da mesma forma que é legítimo o eleitor colocar no poder políticos mais à esquerda ou mais à direita, dependendo da leitura que faz no momento do voto, é obrigação da classe política, seja no Executivo ou no Legislativo, entregar a encomenda do eleitor. É desrespeito chegarem ao poder, eleitos, e esquecerem para o que foram escolhidos pela sociedade.
Vamos aos outros caminhos:
– Uma nova Constituição. Não adianta argumentar que a Constituição dos Estados Unidos existe há mais de 200 anos e quase nunca foi alterada. O caso do Brasil, uma Nação ainda em formação, é diferente. A Constituição de 1988 foi redigida e aprovada como um grito de liberdade depois dos 21 anos do regime militar. Além das suas qualidades inegáveis, a chamada “Constituição Cidadã” abusou da concessão de direitos e foi econômica na fixação de deveres. É preciso rever isso. Afinal, a sociedade mudou e quer um ajuste para a Constituição se adequar ao momento atual. E para que a Carta Magna não envelheça tão rapidamente, basta que ela contenha os princípios básicos para conduzir o país e a sociedade e deixe o restante para a legislação ordinária definir.
– O fim da reeleição. Ficou absurdamente claro, ao menos na minha visão, que o instrumento da reeleição fracassou terrivelmente no Brasil. Ao invés de premiar os bons governos e bons parlamentares, a reeleição cumpre o papel negativo de promover o flerte da classe política com o sonho de eternização no poder. O governante que ganha quatro anos de mandato, desde o primeiro dia de governo passa a sonhar com mais quatro anos de um segundo mandato e, quem sabe, na sequência eleger um companheiro para mais quatro ou oito anos de poder do mesmo grupo. No Legislativo é o mesmo. Sem um limite de mandatos consecutivos, o parlamentar faz de tudo para fechar as portas de quem quer entrar na vida política e, com isso, garantir décadas seguidas de poder.
Vamos arrumar a casa?
Respeito todas as opiniões. Convido você a pensar nesse assunto e dar a sua opinião na página e no grupo do SuperBairro no Facebook. Só peço serenidade e intenção de melhorar o Estado brasileiro em vez de atirar gasolina para apagar o incêndio atual com palavras de baixo calão ou ofensas pessoais entre os que também opinarem.
Se existe uma certa sensação de paz nesse momento, que pode ser uma paz enganosa, mas tem um efeito benéfico sobre o nosso dia a dia, não se iluda, porque a chaleira deve voltar a ferver.
Vamos pensar no curto, mas também no longo prazo, no país da nossa velhice e dos nossos filhos e netos. Muda Brasil!
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.
*Texto atualizado às 14h29 do dia 14/9/2021 para correções gramaticais e da data no primeiro parágrafo. Segunda-feira foi dia 13 e não 12, como foi publicado anteriormente.