Ricardo Aleixo
Conheço vocês
pelo cheiro,
pelas roupas,
pelos carros,
pelos anéis e,
é claro,
por seu amor
ao dinheiro.
Por seu amor
ao dinheiro
que algum
ancestral remoto
lhes deixou
como herança.
Conheço vocês
pelo cheiro.
Conheço vocês
pelo cheiro
e pelos cifrões
que adornam
esses olhos que
mal piscam
por seu amor
ao dinheiro.
Por seu amor
ao dinheiro
e a tudo que
nega a vida:
o hospício, a
cela, a fronteira.
Conheço vocês
pelo cheiro.
Conheço vocês
pelo cheiro
de peste e horror
que espalham
por onde andam
– conheço-os
por seu amor
ao dinheiro.
Por seu amor
ao dinheiro,
deus é um
pai tão sacana
que cobra por
seus milagres.
Conheço vocês
pelo cheiro.
Conheço vocês
pelo cheiro
mal disfarçado
de enxofre
que gruda em
tudo que tocam
por seu amor
ao dinheiro.
Por seu amor
ao dinheiro,
é com ódio
que replicam
ao riso, ao gozo,
à poesia.
Conheço vocês
pelo cheiro.
Conheço vocês
pelo cheiro.
Cheiro um e
cheirei todos
vocês que só
sobrevivem
por seu amor
ao dinheiro.
Por seu amor
ao dinheiro,
fazem até das
próprias filhas
moeda forte,
ouro puro.
Conheço vocês
pelo cheiro.
Conheço vocês
pelo cheiro
de cadáver
putrefato que,
no entanto,
ainda caminha
por seu amor
ao dinheiro.
Ricardo José Aleixo de Brito, ou apenas Ricardo Aleixo, nasceu em Belo Horizonte (MG) em 1960. É autodidata e atua em diversas áreas. Estreou em 1992 com o livro Festim. Em Belo Horizonte é curador do Festival de Arte Negra (FAN), coordenador de projetos culturais. Edita a revista Roda – Arte e Cultura do Atlântico Negro, pela Fundação Municipal de Cultura de Belo Horizonte.
> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.