Rua Carlos Chagas, no Esplanada: homenagem à ciência brasileira. Foto / SuperBairro

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

DA REDAÇÃO

Em tempos de ciência x negacionismo, vale a pena lembrar que o Brasil já teve médicos sanitaristas consagrados mundialmente. São os casos de Osvaldo Cruz e Carlos Chagas. Este último, foi homenageado em São José dos Campos dando seu nome a uma rua arborizada e tranquila no Jardim Esplanada.

Carlos Ribeiro Justiniano Chagas nasceu em uma fazenda de café próxima de Oliveira (MG) no dia 8 de julho de 1878, filho de José Justiniano Chagas e de Mariana Cândida Ribeiro de Castro Chagas.

Já alfabetizado, foi matriculado no Colégio São Luís, internato dirigido por jesuítas em Itu, interior de São Paulo. Mas não ficaria ali por muito tempo. Em maio de 1888, ao ter notícia de que os escravos então libertados estariam depredando fazendas, fugiu para ir ao encontro de sua mãe. A indisciplina foi punida com a expulsão e o menino passou a estudar no Ginásio São Francisco, em São João del Rei (MG).

Concluídos os estudos, sua mãe decidiu que ele deveria formar-se em engenharia. Em 1895, ingressou no curso preparatório da Escola de Minas de Ouro Preto, tradicional centro de ensino superior. Contudo, os excessos da vida boêmia custaram-lhe a reprovação nos exames e o retorno a Oliveira.

Com a ajuda de um tio médico, o jovem Chagas venceu a resistência da mãe e, em 1897, mudou-se para o Rio de Janeiro, então Distrito Federal, matriculando-se na Faculdade de Medicina.

Em março de 1904, foi nomeado médico da Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP) e passou a trabalhar no Hospital Paula Cândido, em Niterói (RJ). No mesmo ano, instalou seu consultório particular no centro do Rio de Janeiro e casou-se com Íris Lobo, filha do senador mineiro Fernando Lobo Leite Pereira.

Para realizar sua tese de doutoramento, exigida para a conclusão do curso médico, dirigiu-se em 1902 ao Instituto Soroterápico Federal, também conhecido como Instituto de Manguinhos e, a partir de 1908, como Instituto Osvaldo Cruz.

Em 1905 foi designado por Osvaldo Cruz –que em 1903 fora nomeado diretor da DGSP pelo presidente Rodrigues Alves para empreender o saneamento da capital federal–, para combater uma epidemia de malária em Itatinga (SP), que paralisava a construção, pela Companhia Docas de Santos, de uma usina hidrelétrica que serviria ao porto.

Dois anos depois, comandou nova investida contra a malária, em Xerém, Baixada Fluminense. Em junho de 1907, foi enviado por Cruz ao norte de Minas Gerais em uma terceira campanha contra a malária, que atingia os operários que realizavam a extensão da Estrada de Ferro Central do Brasil, entre as cidades de Corinto e Pirapora.

No povoado de São Gonçalo das Tabocas (que em 1908 passaria a se chamar Lassance), instalou um pequeno laboratório em um vagão de trem. Além das atividades concernentes à malária, dedicou-se a pesquisar animais silvestres e insetos da região, motivado por seu interesse em protozoologia e entomologia.

Doença de Chagas

Em 1908, um engenheiro da ferrovia chamou sua atenção para um inseto sugador de sangue que proliferava nas frestas das paredes das casas de pau a pique típicas da população pobre nas áreas rurais do país. Era conhecido como “barbeiro”, por picar preferencialmente o rosto das pessoas durante a noite.

No interior de alguns desses insetos, Chagas encontrou um protozoário em forma de tripanossoma. Naquela mesma região, já havia identificado, em saguis, uma nova espécie desse gênero de protozoários, a qual batizara de Trypanosoma minasense.

Chagas enviou alguns insetos para Osvaldo Cruz, em Manguinhos, que os pôs em contato com macacos criados em laboratório. Informado de que um dos macacos havia adoecido, ele retornou a Manguinhos e constatou que se tratava de uma nova espécie de tripanossoma, que denominou de Trypanosoma cruzi em homenagem a Osvaldo Cruz.

Com a hipótese de que o T. cruzi fosse patogênico para o homem, Chagas retornou a Lassance e realizou exames de sangue nos habitantes da região. Após encontrar um gato infectado, identificou, em 14 de abril de 1909, o novo parasita no sangue de uma criança febril de 2 anos. A menina Berenice foi então considerada o primeiro caso da doença que receberia o nome de tripanossomíase americana, ou doença de Chagas.

A façanha foi considerada uma “glória” da ciência nacional, sendo enaltecida como “feito único” na história da medicina pelo fato de um mesmo pesquisador, em um curto espaço de tempo, identificar uma nova enfermidade, sua causa e seu transmissor.

Duas indicações ao Nobel

A descoberta e os estudos sobre a doença trouxeram grande prestígio científico a Carlos Chagas, que se tornaria membro de importantes associações médico-científicas no Brasil e no exterior e receberia diversas homenagens, títulos e condecorações.

Em 1913, foi indicado ao Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia. Em 1921, ano em que recebeu sua segunda indicação ao Nobel, foi o primeiro brasileiro a receber o título de doutor honoris causa da Universidade de Harvard. A mesma distinção lhe foi concedida em 1926 pela Universidade de Paris.

Em 14 de fevereiro de 1917, três dias após a morte de Osvaldo Cruz, foi nomeado diretor de Manguinhos pelo presidente da República, Venceslau Brás (1914-1918), cargo que ocuparia até seu falecimento.

Em 1918, as reivindicações do movimento sanitarista foram amplificadas com a chegada da gripe espanhola ao Brasil, em uma devastadora epidemia na capital federal. Chagas foi nomeado pelo Governo Federal para coordenar a assistência médica à população, instalando hospitais e postos de atendimento emergenciais em diversos pontos da cidade.

Faleceu subitamente aos 56 anos, em 8 de novembro de 1934, no Rio de Janeiro, em sua casa na rua Paissandu, bairro do Flamengo, em decorrência de problemas cardíacos.

Seus dois filhos, Evandro (1905-1940) e Carlos Chagas Filho (1910-2000) tiveram destacadas carreiras científicas.

 

> Fonte – Condensação de artigo publicado no site do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil, da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC/FGV). Texto integral: http://cpdoc.fgv.br/sites/default/files/verbetes/primeira-republica/CHAGAS,%20Carlos.pdf

> Título modificado em 13/4/2021