Wisława Szymborska
Se os eleitos dos deuses morrem cedo,
o que fazer do resto da vida?
A velhice é como um abismo
já que a juventude é o cume.
Daqui não saio.
Continuarei jovem ainda que numa perna só.
Com bigodes fininhos
como o guincho de um rato
me agarro ao ar.
Nessa posição renasço continuamente.
Não conheço outra arte.
Mas serei sempre eu:
as luvas mágicas,
na lapela a roseta da primeira mascarada,
o falsete dos manifestos juvenis,
o rosto do sonho da costureira com um crupiê,
os olhos que eu gostava de pintar retirados
e de espalhá-los como ervilhas de uma fava,
pois vendo isso tremiam as coxas mortas
da rã pública.
Espantem-se também vocês.
Espantem-se, por cem barris de Diógenes,
que eu o venço em ideias.
Rezem
o recomeço eterno.
Isto que seguro nos dedos
são aranhas que mergulho na tinta nanquim
e atiro na tela.
Estou no mundo outra vez.
Floresce um novo umbigo
na barriga do artista.
* Tradução da Regina Przybycien
Wisława Szymborska foi uma escritora polonesa ganhadora do Prêmio Nobel de literatura em 1996. Poeta, crítica literária e tradutora, viveu em Cracóvia. Wislawa nasceu em 2 de julho de 1923, em Kórnik (Polônia) e morreu em 1º de fevereiro de 2012, em Cracóvia (Polônia). Fonte: Wikipédia
> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.