Mia Couto
Na minha terra
há uma estrada tão larga
que vai de uma berma à outra.
Feita tão de terra
que parece que não foi construída.
Simplesmente, descoberta.
Estrada tão comprida
que um homem
pode caminhar sozinho nela.
É uma estrada
por onde não se vai nem se volta.
Uma estrada
feita apenas para desaparecermos.
Para Ti
Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo
Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que talhei
o sabor do sempre
Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só
amando de uma só vida.
Mia Couto, pseudônimo de Antonio Emílio Leite Couto, é um escritor, poeta e biólogo moçambicano. Nasceu na cidade de Beira, em 5 de julho de 1955. Adotou seu pseudônimo porque tinha paixão por gatos. Dentre os prêmios literários que recebeu, destacam-se o Neustadt, tido como o “Nobel Americano”, e o Prêmio Camões, o mais importante dos países de língua portuguesa. (Fonte: Wikipédia)
> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.