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Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Wanderley Mira, amigo por quem tenho apreço de longa data, costuma chamar de braço curto quem não é muito dado ao trabalho. Sei lá no que ampara sua assertiva, pois nunca tive a curiosidade de lhe perguntar. Imagino que se refira a quem não desenvolva uma atividade produtiva a contento; de quem se pode dizer enrolão, embromador, folgado ou coisa semelhante a vagabundo –para abreviar.

Os antigos tinham o costume de exibir a palma da mão para comprovar a proximidade com o trabalho. A mão cascuda, machucada e até com bolhas era sinal de experiência, de destemor com o batente, normalmente pesado e bruto. No meio rural, até hoje o matuto espalma a mão para atestar que é sacudido.

E chegamos ao cerne da questão. Por ser incomum, no texto que publiquei neste espaço na semana retrasada, a palavra guatambu suscitou alguma surpresa, mesmo colocada no sentido figurado. A ponto de um amigo/leitor, dos seis que me seguem aqui, fazer uma referência jocosa sobre o termo. Como foi numa conversa informal, aproveitei para lhe contar esta passagem –aqui encurtada– que, de certa forma, joga alguma luz sobre minha afinidade com o dito pau.

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Meu pai se foi com 98 anos. Era rude, mas bom. Boa parte de sua estada aqui, ele trabalhou num pequeno sítio, onde forjou a vida no cabo da enxada, roçando pasto, esgotando brejo, plantando e colhendo. Foi como ganhou as mãos calejadas, das quais se orgulhava.

Talvez por sua formação e uma vida de trabalho, de quem saía cedo e voltava tarde, não escondia a aversão pelo indivíduo preguiçoso e do braço curto, o que, para ele, bem caracterizavam o malandro. Esse tipo de gente ele identificava logo, e fazia questão de se manter distante.

Em dado momento de sua vida, passou um sujeito de boa lábia, braços apequenados, cuja intenção, me pareceu, era entrar para a família. Experiente, meu pai recorreu a informações sobre o passado do pretendente e levou o pé atrás com o que descobriu. Homem de fé, agarrou-se à reza para que no mar da vida os ventos soprassem aquele barco furado para outros portos, o que de fato aconteceu.

Mas até experimentar a bonança, certa vez presenciei um dos meus irmãos testar o nível da bronca de meu pai depois que descobriu que, em vez de currículo, o biltre tinha folha corrida. Foi quando eu disse, brincando, que o desocupado estava decidido a visitá-lo para uma conversa de homem para homem. Ao que ele me respondeu, sem pestanejar, nem disfarçar contrariedade: “pois que venha; o dele está guardado!”.

E levantou-se ríspido da mesa onde tinha acabado de tomar uma xícara de café preto com bolo de fubá. Caminhou apressado em direção ao quarto, e pegou, pendurado atrás da porta, um relho que guardava como relíquia do tempo em que ganhou os calos nas mãos, na dura lida na roça.

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De tão antigo, o açoite tinha uma trança ressequida de três finos fios de couro bovino firmemente presa numa extremidade da madeira roliça e de pouca verga. Quando quis saber se aquilo não podia machucar o candidato, ele riu, matreiro, e disse: “mas o que eu reservo para o espertalhão é isso”; e exibiu o cabo do chicote pouco acima da cabeça, segurando-o pelas pontas com as duas mãos. Quase morri de rir.

Naquele dia eu fui apresentado ao pau do guatambu, que meu pai explicou o que era e para que servia. Acho que tinha o tamanho e a espessura de uma bengala, como a que um certo dia atacou, furiosa, a cabeça de um certo Zé.

Homem de paz e do bem, meu pai estava caçoando, claro!; mas o sujeito –talvez antevendo o tamanho da encrenca– acabou baixando em outra freguesia. E eu aprendi que, além de excelente para encabar ferramentas, o pau do guatambu é um santo remédio para enxotar malandro do braço curto.

Assim, eu e meu amigo/leitor encerramos a conversa: dando boas risadas.

 

> Carlos José Bueno é jornalista profissional (MTb 12.537). Aposentado e no ócio, brinca. Com os netos e as palavras.