− Pode dar meia volta, menina! Aqui não é cavalariça para ter mulheres de botas. Vai cavalgar noutro lugar. Estamos na Faculdade de Direito, um tempo de ensino das leis. Tenha respeito!
E afugentava as jovens corajosas, todos já sabendo do velho professor irascível. Era a década de 1960, o professor, o provecto Dr. Luiz de Azevedo Castro, terror dos jovens incautos na Faculdade de Direito, hoje da Univap. Também dos demais, pois seu sistema de notas era misterioso.
Diziam que ele, na correção de provas, jogava-as para cima, por sobre uma escada. No degrau que caísse, era a nota. Só que havia somente seis degraus… Dez? Só se a prova caísse de pé!
O velho, antigo procurador de justiça, foi um dos criadores da própria faculdade. Seu linguajar um tanto folclórico, da época do grande Ruy. Discursos inflamados, realçando, geralmente, a luta dos paulistas durante a Revolução de 1932. Os demais estados, que apoiaram o ditador, chamam-na de Revolução Paulista.
Com dois seis, eram duas provas anuais, fui para o segundo ano. Ufa! Acho que merecia mais.
O mestre era alvo de imitações dos alunos jocosos e com talento para o deboche. Azar de um, que acabou sendo surpreendido pelo professor durante uma imitação caricata e ficou durante cinco longos anos, depois do quinto, amargando uma dependência em Direito Constitucional.
Naquela época o respeito era outro, os professores eram geralmente figurões, vinham para as aulas num ônibus que ia buscá-los em São Paulo. Lembrança dos mestres Cretella Júnior, João Del Nero, Arnaldo Amado Ferreira, Cândido Dias Castejón, Orlando Campos. Também os professores do meu primeiro ano, como o Dr. Azevedo Castro: Amaury Moraes de Maria, Sebastião Henrique da Cunha Pontes, Geraldo Carlos de Almeida Camargo, Carlos Alberto Cineli e Walker Barbosa. Destacava-se o Dr. Geraldo, disciplinador, mas excelente mestre.
Já no segundo ano, outro professor de excelência, igualmente juiz de direito em São José dos Campos: Alberto Gentil de Almeida Pedroso Filho, adorado pelos alunos. Esses dois mestres incentivavam muito os alunos para seguir a carreira na magistratura, poucos o fizeram.
Interessante no meu quarto ano era o culto professor Neif Mattar de Oliveira. Na véspera das provas, dizia aos alunos: vocês podem trazer aquelas suas colinhas, tirinhas, anotar no corpo, livros, apostilas, o que quiserem. Todos ficavam espantados. Mas nas provas ele dava questões bem difíceis e até permitia que os alunos conversassem. Não era fácil, os alunos tinham de saber achar nos livros elementos para resolver as questões.
Esse mesmo professor, volta e meia, fazia chamada oral. Ia chamando os alunos para falar para a classe. O que, mestre? Respondia: o que você quiser, fale. A gente procurava se esconder para não falar. Porém, alguns mais saidinhos –e ruins de nota– adoravam fazer discursos. O mestre procurava desinibir os alunos.
Contei para tia Filoca essas práticas do professor e ela, como sempre, foi ácida:
− Esse professor só pode estar brincando. Aposto que só se ouve abobrinha de alunos, cada um querendo aparecer mais que o outro. Não é assim que se formará bons bacharéis. Onde já se viu permitir trazer colinhas para a prova? Já não se faz professores como antigamente!
Ainda bem que não contei para a tia o que o professor Azevedo Castro, empolgado, dizia em suas aulas:
− Durante a gloriosa Revolução Constitucionalista os pracinhas enchiam os seus cantis com o suor dos seus rostos!
> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.