Nunca fui de prestar atenção em letras de músicas. Sempre fui da melodia, da harmonia, do som. Pode parecer estranho, mas sempre fui assim. Tudo bem, vai… Algumas do Chico e do Caetano me pegaram pela inteligência, pelo lirismo, pelo jogo de palavras. Mas, no geral, é a música que me atrai. Tanto que participo como baixista de três grupos de música instrumental –Benoit Jazz Quartet, Raul de Sá Trio e a Virtual Jam Band, novo projeto citado na minha coluna de estreia no SuperBairro.
Abordo esse tema pois fiquei tocado por um artigo publicado no livro Música com Z (Editora 34) do jornalista e crítico de música Zuza Homem de Mello, um dos maiores especialistas em MPB e jazz de nosso país. Estou devorando o livro, obra fundamental para quem curte música neste país maltratado pela atual produção musical que bombardeia nossos ouvidos. Ok, há exceções, mas são poucas.
Zuza abre o artigo, originalmente publicado na revista Época em abril de 2000, com a seguinte indagação: como selecionar os quinze versos mais bonitos da música popular brasileira? E é uma atrás da outra! Aldir Blanc: “Eu hoje me embriagando/ de whisky com guaraná (…) e a ponta de um torturante band-aid no calcanhar”. Genial!
Ou esses dois versos de Noel Rosa em Feitio de Oração: “Quem acha vive se perdendo”; e “Batuque é um privilégio/ ninguém aprende samba no colégio”. O que dizer?
O grande Vinícius de Moraes tem lugar cativo na lista com essa pérola da canção “A felicidade”, dele em parceria com Tom Jobim. “A felicidade é como a gota de orvalho numa pétala de flor/ brilha tranquila, depois, de leve oscila/ e cai como uma lágrima de amor”.
E segue com Paulinho da Viola: ”Foi um rio que passou em minha vida/ e o meu coração se deixou levar”; Cartola, em “As rosas não falam”, 1976: ”Queixo-me às rosas/ mas que bobagem, as rosas não falam/ simplesmente as rosas exalam/ o perfume que roubam de ti”.
E nessa época que estamos vivenciando, de tristeza e, às vezes, até desesperança, é sempre bom lembrar Lenine nos versos da música Paciência.
“Enquanto todo mundo espera a cura do mal/
E a loucura finge que isso tudo é normal/
Eu finjo ter paciência
…. Mesmo quando o corpo pede um pouco mais de alma/
Eu sei, a vida não para/
A vida não para não…”
> Henrique Macedo é jornalista profissional e músico. Mora há 40 anos na Vila Ema.