A música é transcendente e tem a capacidade de modificar com suas vibrações o ambiente onde ecoa. Concorda comigo?
Agora imagine estar no ambiente desalentador de um hospital, e, do nada, a Primavera, das 4 Estações, de Vivaldi, quebrar o silêncio respeitoso destinado às dores individuais.
É o que pode estar ocorrendo nesse momento em um hospital no Rio de Janeiro, onde o músico Cristiano Andrade empunha seu violino e toca para pacientes com covid-19 e os profissionais que cuidam deles.
Enquanto isso, em um hospital da zona sul de São Paulo, a taubateana e médica residente Brunna Falluh, arranja tempo na maratona de trabalho que existe em uma UTI para tocar violão e cantar para os pacientes de quem ajuda a tratar.
Em meio às informações constantes –e necessárias– sobre o avanço implacável do coronavírus, é desanimador ver também notícias sobre o egoísmo absoluto de gente que deveria estar cuidando de gente e usa seus cargos e posição para furar a fila de vacina, por exemplo. Pessoas que se recusam a usar máscara e a ficar em casa, mesmo que possam. Outros ainda que desdenham da vacina.
Nesse cenário, a notícia do violinista, que desafia o próprio medo de contrair a doença e vai levar a alegria da sua música a pessoas internadas, e da médica que toca violão, são como um raio de sol em um dia cinzento.
Elas nos lembram que, apesar de tudo, está cheio de humanos bacanas fazendo coisas incríveis por aí. Apenas não estamos falando disso. E precisamos.
Será que o cartaz no elevador avisando aos idosos e grupos de risco do prédio que estamos à disposição para ir buscar suas compras no mercado ainda está lá? E o que mais podemos fazer para mudar a vibração à nossa volta?
É possível sair da concha mesmo sem sair de casa e dedicar nosso tempo para melhorar a vida de alguém. Qualquer alguém.
Podemos pegar o telefone e ligar –falando mesmo, não escrevendo– para um amigo e perguntar como ele está se virando no isolamento.
Oferecer um copo de água ou um chocolatinho ao motoboy que veio entregar sua encomenda da Amazon pode ser a diferença no dia desgastante do trabalhador.
Também dá para encomendar um vasinho de flores pelo delivery e presentear a enfermeira que mora no andar de baixo e carrega o mundo nas costas a cada plantão que faz. De quebra, você estará ajudando um comerciante do seu bairro.
A música do violinista ecoando nos corredores do hospital Semiu, lá no Rio, pode ecoar em cada um de nós e abrir caminho para a solidariedade, nos lembrando que sozinhos não vamos a lugar nenhum.
As histórias dessas pessoas que fazem coisas simples, mas grandiosas, nos mostram que a pandemia talvez não modifique as pessoas para melhor, como muitos preconizaram há algum tempo, mas o sofrimento pandêmico pode tirar lindas atitudes de dentro dos corações que já são bondosos. E isso basta para mudar o mundo.
> Maria D’Arc Hoyer é jornalista (MTb nº 23.310) há 28 anos, pós-graduada em Comunicação Empresarial. Mora na região sudeste de São José dos Campos. É autora do blog recortesurbanos.com.br.