Benedito Gonçalves dos Santos, o Nenê, exibe uma forquilha de goiabeira idêntica à que utiliza para achar água no subsolo. Foto / Carlos José Bueno

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Antônio Francisco de Assis e Benedito Gonçalves dos Santos (Nenê) são setentões amigos de longa data. O primeiro tem um sítio no Souzas, em Monteiro Lobato; o segundo mora numa chácara em Conceição dos Ouros, sul de Minas Gerais.

Apesar das chuteiras penduradas, ambos dispõem de boa dose de energia, por isso continuam na lida. Assis não sua mais a camisa ajudando descarregar carreta de madeira, mas mantém as rédeas do negócio de comércio de material de construção.

Nenê é eclético. Ex-funcionário da Embraer, foi barbeiro e teve oficina de móveis planejados. Aposentado, hoje mexe no pequeno pedaço de chão criando galinhas, tilápias, entre outras atividades. Além disso, há oito anos exerce, com habilidade, a arcaica –mas sempre atual– radiestesia.

Cerca de um mês atrás, Nenê dava derradeiras pinceladas de tinta numa roda d’água quando seu celular tocou. Era o Assis encarecendo-lhe os préstimos de radiestesista para resolver um problema de falta d’água na chácara da sogra, na região Sudeste de São José dos Campos.

A radiestesia é um método milenar pelo qual se procura água no subsolo –além de minérios. A técnica não tem aval científico, mas, segundo Nenê, por puro corporativismo dos geólogos. E comprova com números. Desde que mexe com isso furou mais de uma centena de poços artesianos no Sul de Minas Gerais e Vale do Paraíba, com 90% de sucesso.

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Para os geólogos, procurar água subterrânea valendo-se apenas de um pêndulo ou uma forquilha de amoreira, jabuticabeira ou outra, é chute e tem muito a ver com crendice. Nenê rebate. E justifica citando Napoleão Bonaparte que, no seu dizer, valia-se desse recurso para achar água para matar a sede dos seus soldados nos campos de batalha.

Nenê me contou um pouco dessa atividade na cozinha de sua casa, em Ouros, onde, junto com a mulher, Alzira, gentilmente me acolheu no último feriado. A prosa foi regada a cerveja e tira-gosto. Ante minha curiosidade e uma pitada de incredulidade, prometeu me mostrar veios d’água no seu terreno usando um simples galho de árvore em forma de Y.

No dia seguinte bem cedo, tomei café com os demais convivas e perguntei pelo dono da casa. Ele já saracoteava no quintal dando milho para as galinhas, tirando da chocadeira os pintinhos dos ovos eclodidos, virando e mexendo. Manoel, outro da turma, estava com ele.

Acheguei-me e logo quis saber onde tinha água debaixo dos meus pés. Decidido a me esclarecer, mais que depressa quebrou um galho de goiabeira de três pontas, desfolhou-o e caminhou pelo terreiro segurando duas extremidades entre os dedos das mãos viradas para cima, na altura do umbigo.

Em certo momento, a terceira ponta, então livre, descambou abruptamente para baixo percorrendo 180 graus. “Viu? Aqui tem água!”, disse. E continuou uns 100 metros adiante até que, de novo, o galho verde da goiabeira moveu-se. “Aqui dá outro poço!”, garantiu. Fiz a experiência e, mesmo sem habilidade, não pude conter o mexer da forquilha.

Então quis saber, depois de achar o ponto ideal de furação, quantos metros tinha que brocar até atingir o veio ou lençol. Simples, disse-me –já avisando não ser ciência, mas experiência.

“Eu movimento a forquilha levemente para cima e para baixo até que se mantenha inerte na posição horizontal. Aí, calculo a distância para o solo. Se der cinco centímetros, vou achar água com cinco metros; se der dez, com dez metros, e assim por diante. Esses números são aproximados”, avisou.

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No dia seguinte, Assis chegou para se enturmar e ajudar a plantar uma leira de batata doce. Depois, na varanda da casa, diante de um balde de tilápias fresquinhas, mistura do almoço, a única conversa pouco crível era do pescador Zinho, de que tinha perdido anzol e vara numa briga insana com um valente pacu.

No amplo hall, tendo como testemunha uma rolinha de arrulhar incessante no ninho sobre o pilar, este jornalista inquiriu o recém-chegado. E aí, a água jorrou?, perguntei. Assis respondeu com um joinha, deu detalhes e corroborou o feito do amigo, para quem achar água subterrânea com ajuda de um graveto requer experiência, habilidade e, principalmente, sensibilidade para captar as energias brotadas da escuridão da terra.

 

> Carlos José Bueno é jornalista profissional (MTb nº 12.537). Aposentado e no ócio, brinca. Com os netos e as palavras.

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