Ilustração / Pixabay

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

– Pare com isso, Zezinho, você quer ser bom com todo mundo e só se ferra! Puxou alguém que conheço, ao invés de ser bom, era bonzinho. Comigo não tem não, procuro ser boa, mas não tolero folga ou abuso. Pare de mimar os outros!  De boas intenções o cemitério está cheio!

Não falei nada, tia Filoca tinha alguma razão, embora eu não gostasse do pito. No entanto, o assunto é mais complicado. O tal bonzinho pode mesmo ir para o inferno.

Bom e bonzinho são coisas diferentes, um é virtude, outro, vício. Deixe explicar melhor. Ser bom está na Bíblia (São Paulo). O cristão deve ser bom (procure o bem e o bem virá; procure o mal e o mal terá), amar a Deus e ao próximo.

O mesmo apóstolo ensinou que não devemos deixar de dar reprimenda quando alguém se desvia do caminho da virtude, não tolerar o desvio, o pecado. Pois bem, ser bom não é tolerar todos os caprichos alheios, satisfazer a vontade dos outros, enfim, ser fraco diante do errado, conivente com o erro, tergiversar.

Insisto: mimar, passar a mão na cabeça, deixar de chamar a atenção, dar espaço para folgados ou permitir que outros abusem da sua bondade, não é ser bom. Quando você quer assumir novamente as rédeas, não consegue mais. Fica somente bonzinho, mas perde o respeito dos outros e o seu mesmo. Isso vale para muitas situações de vida, profissionais, domésticas e sociais.

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Figuras identificáveis de bonzinho, por exemplo, é o pai molenga e permissivo, o camisolão no casamento (entre outros, o corno), o saco de pancada no serviço, o pagador do mico na sociedade, numa linguagem atual. Como dizia tia Filoca, bonzinho é quem entrega o ouro para o bandido, como no caso do cornudo do programa humorístico da TV que ajudava os ricardões, os amantes da mulher. No fim, esta dizia, no maior cinismo: meu marido é tão bonzinho!

Mesmo o da clássica piada do alemão que, depois do adultério da mulher, jogou fora o sofá onde ele se consumou, como se isso fosse apagar o que houve. Sem tiros, nem gritos com a mulher, nem muito menos com o amásio. Solução germânica, fria. Risível para o brasileiro padrão ou para o homem latino, daí a anedota.

Bonzinho, pois, nunca, embora posso esclarecer que tudo isso comporta gradação, tanto quanto à frequência quanto à qualidade. Dom Pedro II, por exemplo, era chamado de Pedro Banana, contemporizador, tolerante com críticas e deboches, notadamente das charges ferinas da época. Não permitia censura, numa atitude surpreendentemente republicana, o que pode ter sido uma virtude, porém o povo cobrava mais atitude. Perdeu o trono.

Aqui e ali fui bonzinho, contudo, sem sofás ou ricardões, nem tronos, não sendo essas as motivações da fala da tia. Afinal, quem é que não mimou um filho, um irmão, tolerou um colega ou mesmo um chefe ou amigo? Ou não atendeu aos desejos da mulher, sem pedir contraprestação mínima?

Agora mesmo estou indo pegar um neto na escola, depois de remeter uma graninha para outro. Ah, antes, fazer as compras do supermercado que minha mulher encomendou, senão a coisa pega lá em casa!

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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