Assim como há quem afirme que o Holocausto não existiu, passados mais de 100 anos do extermínio do povo armênio pelo Império Otomano, o fato ainda é negado por pessoas e países. No primeiro, as vítimas foram seis milhões de judeus; no segundo, 1,5 milhão de pessoas da mesma nacionalidade foram cruelmente dizimadas.
O início se deu em abril de 1915, quando intelectuais e líderes comunitários foram presos por autoridades otomanas em Constantinopla, enquanto homens, mulheres e crianças armênios eram deportados, levados a campos de concentração e assassinados aos milhares durante a Primeira Guerra Mundial.
O diretor Terry George, que já havia abordado o genocídio de Ruanda em 1994 (“Hotel Ruanda”), desta vez nos traz “A Promessa” (The Promisse”) e utiliza um triângulo amoroso para evidenciar o extermínio do povo armênio. O jovem Michael (Oscar Isaac: “A Família Addams”, “A vida em Si”) alimenta o sonho de estudar medicina; sem condições de pagar os estudos, ele sela o compromisso de casamento com uma garota de seu vilarejo e recebe um dote. Com esse dinheiro, viaja para a Turquia e inicia os estudos nos meses finais do Império Otomano.
Ali, Michael conhece e se apaixona pela bela armênia Ana (Charlotte Le Bom: A Travessia”, “A 100 Passos de um Sonho”), que namora Chris (Christian Bale: “Ford vs. Ferrari”, “A Grande Aposta”, “Vice”), um fotógrafo americano que está na Turquia para registrar as atrocidades dos turcos contra a minoria armênia. Uma bela e chocante fotografia nos coloca à frente do inegável.
Lançado em 2017, o filme está disponível na Netflix.
MELHOR É IMPOSSÍVEL
Jack Nicholson faz parte daquele grupo já comentado aqui, de atores que elevam a audiência de um filme ou série pelo simples fato de fazerem parte do elenco. “As Good as it Gets” é uma comédia dramática de 1997, protagonizada por Melvin (Jack Nicholson: “Um Estranho no Ninho”, “O Iluminado”, “Alguém tem que Ceder” e dezenas de outros bons filmes), escritor de sucesso, solitário, portador de transtorno obsessivo-compulsivo, extremamente preconceituoso e homofóbico.
Impaciente e de língua afiada, Melvin almoça diariamente no mesmo restaurante, senta à mesma mesa, faz o mesmo pedido e precisa ser atendido pela mesma garçonete, Carol (Helen Hunt: “O Recepcionista”, “Quando me Apaixono”. Série “Mad About You”). A rotina do escritor começa a sair do seu controle quando Carol falta ao trabalho para cuidar do filho doente, ao mesmo tempo em que ele é obrigado a cuidar do cachorro de seu vizinho Simon (Greg Kinnear: “Missão no Mar Vermelho”, “Pequena Miss Sunshine”), um artista plástico homossexual.
Gravemente ferido após um assalto em sua residência, Simon é hospitalizado e o marchand obriga o escritor a cuidar do pequeno animal, a título de acerto de contas por tê-lo maltratado em ocasiões anteriores. As cenas do cão imitando algumas manias de seu cuidador são hilárias! Entre muitos risos, há uma frase sensível e marcante, dita por Melvin a Helen: “Você me faz querer ser alguém melhor”.
Pegue a pipoca e confira, no Now e Amazon Prime.
> Séries
A Netflix foi a grande vencedora da edição 2021 do aguardado prêmio “Emmy” (o Oscar das séries): 44 estatuetas. Há que se reconhecer o mérito do streaming nas belas produções que tem nos oferecido! Aqui, entretanto, vou me ater às duas séries consagradas na premiação ocorrida em 19 de setembro.
THE CROWN
Vencedora de sete categorias de Série Dramática (melhor roteiro, direção, atriz principal, ator principal, atriz coadjuvante, ator coadjuvante e melhor série dramática), esta é uma belíssima produção que conta a história da coroa britânica desde a infância da Rainha Elizabeth II. Em 1952, o rei George VI morre de câncer e Elizabeth (então com 25 anos de idade, casada com Phillip, mãe de Charles e Anne) assume o trono em que se mantém até hoje.
Em seis temporadas, “The Crown” vai acompanhando lentamente o desenvolvimento dos personagens e os importantes fatos históricos (e escândalos) que circundam a família real britânica, sempre com foco na postura, na pressão a que é submetida e decisões tomadas por Elizabeth II, mãe, filha, sobrinha, irmã, esposa, nora, sogra, sempre sobrepondo o papel de rainha a todos os demais.
Nas temporadas iniciais, a protagonista foi interpretada por Claire Fox (“O Primeiro Homem”, “Millenium: a Garota na Teia de Aranha”), substituída na 4ª temporada por Olivia Colman (“Meu Pai”, “A Favorita”), o que lhe valeu o Emmy 2021 de melhor atriz principal de série dramática. Há interpretações magníficas, assim como cenários, fotografia e figurinos. Desde o lançamento, em 2016, “The Crown” ultrapassou 100 milhões de espectadores. Junte-se a eles… e, creio, não vai se arrepender!
O GAMBITO DA RAINHA
No Brasil, gambito é uma palavra utilizada para expressar (de modo jocoso) pernas finas, entretanto no jogo de xadrez o termo significa a rasteira da rainha. Em temporada única (fato confirmado por seu diretor), “O Gambito da Rainha” (“The Queen’s Gambit”) ganhou o Emmy 2021 de melhor minissérie limitada e é uma produção baseada no livro de Walter Trevis, que fala sobre uma menina-prodígio, órfã, que se torna uma enxadrista excepcional.
A protagonista Elizabeth Harmon (Anya Taylor-Joy: “Emma”, “Fragmentado”) carrega um magnetismo ímpar desde pequena e conhece o jogo de xadrez no período em que vive num orfanato. Perseverante, numa época em que esse jogo era exclusividade do universo masculino, Harmon mostra desde cedo suas habilidades, em paralelo à tendência ao vício (iniciado na própria instituição, com pílulas habituais para tranquilizar as internas).
Os sete episódios transitam na década de 60, perceptível na profusão de cores, nos detalhes dos cenários (dentre eles, os hotéis onde se hospeda para os torneios em Paris, Cincinnati, Las Vegas, Moscou e Cidade do México) e na perfeição do figurino –em parte inspirado em Audrey Hepburn.
Atenção: se você tiver o bom gosto de maratonar a série, muito cuidado com a pipoca e bebida às mãos, pois seria imperdoável manchar o casaco, boina e luvas brancas de Harmon durante sua estada em Moscou.
> Tila Pinski é jornalista (MTb 13.418/SP), atua como redatora e revisora de textos, coordenadora editorial e roteirista. Cinéfila, reside há nove anos na Vila Ema.