Sempre que possível, faço minha caminhada no parque Vicentina Aranha, em São José dos Campos, que é repleto de galinhas d’angola, por isso mesmo fica difícil não reparar nas danadas, pois elas ficam espalhadas por todo o parque, inclusive obstruindo os caminhos.
E de tanto olhar para essas penosas resolvi que já era hora de saber mais sobre essas minhas amigas de caminhada e, lógico, contar tudo o que descobri para você.
A primeira coisa que você precisa saber –de acordo com a minha pesquisa– é que a galinha d’angola, apesar do nome, não veio da República de Angola, mas sim da Guiné, um país que, assim como Angola, fica na costa ocidental da África.
O que eu mais curto nessas aves é ver que elas nunca, nunquinha, ficam sozinhas. Isso porque são animais que vivem em bandos e, como grupo, são superorganizadas. Possuem uma líder que fica de vigia enquanto as outras comem e só depois de verificar se está tudo em ordem é que ela começa a comer.
Mas elas brigam, brigam muito umas com as outras. É cada corre que uma dá na outra, que por muitas vezes a que está sendo perseguida é obrigada a voar e se esconder em uma árvore.
Sim, a galinha d’angola voa. Não voa muito, no máximo uns 10 metros, mas voa, e eu já vi a danada alçando voo pesado para fugir da amiga nervosa.
Que mãe é essa?
E por falar em nervosa, essa é uma ave que sabe ser muito, mas muito nervosa, a ponto de ficar estressada por muito pouco. Se a ciscada que a amiga deu perto dela não foi legal, pronto, já começa ali uma discussão e um corre-corre sem fim, além, é claro, da gritaria.
Descobri também que, por conta desse nervosismo todo, as galinhas d’angola não são boas mães. Quando criadas soltas, elas escondem seus ninhos com o requinte de botar os ovos em camadas e ainda cobertos por palha ou qualquer outro material disponível.
E ela bota muito ovo, uma média de 15. Porém, como não gosta de ficar na função de chocadeira, o que acontece é que só os ovos que estão na parte de cima, que recebem um pouco do calor do corpo da mãe, eclodem, os outros não. E ela nem aí pra isso. (Não é o caso do parque Vicentina Aranha, que possui uma incubadora.)
Outra faceta dessa mãe desnaturada é que ela vive arrastando os pintinhos para zonas úmidas, o que coloca em risco a sobrevivência deles.
Portanto, nota zero para a mãe galinha d’angola, que por sinal é bem diferente da prima dela, a galinha sem pintinhas, que é conhecida por proteger seus filhotes como uma leoa e em todas as situações.
Excelente guarda
Mas tem uma coisa que essa galinha faz muito bem: botar os intrusos para correr, seja o bicho homem ou qualquer outro bicho. Por ser muito barulhenta e ficar estressada com tudo, a galinha d’angola é excelente para guardar propriedades.
Se algum intruso entrar no território dela é uma barulheira lascada, seja noite ou seja dia. Esse papel de cuidar do lugar onde mora, ela desempenha com maestria.
Outra excelente característica dessa ave geniosa é que ela auxilia no equilíbrio ambiental através do consumo de insetos, formigas, cobras, escorpiões, carrapatos entre outras “especiarias”.
Interessante saber também que já foi comprovado que quando as galinhas d’angola são criadas no pasto, junto com o gado, a tendência é que esse gado tenha uma saúde muito melhor por conta de ficarem livres das pragas, que são consumidas pelas galinhas.
Vale lembrar que elas também se alimentam de flores, frutos, gramíneas e sementes.
Lendas e religião
Existem três cores da galinha d’angola: a pedrês, mais comum, que é preta ou cinza com bolinhas brancas; uma outra que é inteiramente branca; e a Pampa, que é o cruzamento das duas anteriores. No parque Vicentina Aranha existem galinhas de todas essas cores.
Outra curiosidade é em relação ao nome. A galinha d’angola, cujo nome científico é Numida Meleagris, é conhecida no Brasil pelos nomes de angolinha, capote, caitrê, cocá, além, é claro, do famoso “tô fraco”, apelido que lhe foi dado pelo jeito como ela grita, dando a impressão de estar dizendo: tô fraco, tô fraco.
Existem também muitas lendas em torno da galinha d’angola. Uma delas conta que a morte se instaurou em uma cidade e a população pediu ajuda a Oxalá (divindade da mitologia iorubá, responsável pela criação e administração do mundo). Oxalá, então, requisitou oferendas de uma galinha preta com pó de giz branco nas pontas das suas penas.
Esse efeito de cores assustou a morte, que abandonou a cidade. E é justamente por isso que as sacerdotisas dos orixás são pintadas como a galinha d’angola, indicando a sabedoria de Oxalá, que livrou a cidade da implacável morte. (Fonte: site Artcanal)
Outra lenda que deu origem ao nome da espécie, Meleagris, conta que o príncipe da Macedônia, Meleager, morreu inesperadamente e suas irmãs choraram tanto que foram transformadas por uma divindade em uma ave, cujas pintas de tom perolado representam suas lágrimas.
E vamos combinar que aquelas penas pretas repletas de bolinhas brancas são um charme. Elas não são lá essas coisas de bonitas, mas a “roupinha” que usam é de muita elegância.
E pra você que, assim como eu, gosta de ficar observando os bichos, aconselho passar um tempo no parque Vicentina Aranha se divertindo com o pega-pega das penosas mais nervosas desse planeta: as galinhas d’angola.
Adote
> Edna Petri é jornalista (MTb nº 13.654) há 39 anos e pós-graduada em Comunicação e Marketing. Mora na Vila Ema há 20 anos, ama os animais e adora falar sobre eles.