Tom Hanks aparece em mais um papel marcante, desta vez como o solitário e mau humorado Otto. Foto / Divulgação

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

Eu já comentei anteriormente, nesta coluna, que críticos e premiações cinematográficas não guiam minhas escolhas por este ou aquele filme. Há algumas semanas, quando vi na telona o trailer de “Um Homem Chamado Otto” (o título original “A Man Called Otto”, em alguns cinemas e críticas é apresentado com a péssima tradução “O Pior Vizinho do Mundo”), gostei das cenas de humor e decidi que aguardaria a estreia.

Fiz bem em não me deixar levar pelas críticas negativas: além de mais uma excelente atuação de Tom Hanks (“Um Lindo Dia na Vizinhança”, “Elvis”, “Relatos do Mundo”, O Código Da Vinci”, “Náufrago” e tantos outros bons filmes) –aqui como o protagonista Otto Anderson–, o filme fala de inclusão, diversidade de gênero e intergeracional, ganância, envelhecimento, sempre mantendo como pano de fundo o relacionamento entre vizinhos de uma vila.

Os vincos de um rosto envelhecido pelo tempo e pela dor apresentam o viúvo Otto: sexagenário mal-humorado, metódico, crítico contumaz de vizinhos e de prestadores de serviço na vila de casas onde mora e da qual é síndico. O seu perfil não é diferente no ambiente de trabalho; crítico, avesso a mudanças e sem amigos, seus métodos tradicionais levam a empresa a aposentá-lo de um trabalho que era, então, seu único motivo de viver.

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Decidido a dar fim à própria vida, vazia e imersa nas lembranças de Sonya (Rachel Keller: séries “The Society”, “Legion”), seu grande e eterno amor, Otto tem sua rotina interrompida com a chegada de uma nova família à vila. O casal mexicano Marisol (a excelente Mariana Treviño: “Homens ao Mar”, “Elvira”. Série “Club de Cuervos”) e Tommy (Manuel García-Rulfo: “O Poder e a Lei”, “As Viúvas”) aluga uma das casas e, um tanto desajeitados, por várias vezes pedem ajuda a Otto. Em agradecimento, o casal sempre oferece um dos pratos por ela preparados, todos de suas tradições familiares –e que Otto aprende a apreciar.

O estado avançado de gestação acelera a falante e enérgica Marisol, que tem duas filhas pequenas para cuidar e não se deixa intimidar pelo jeito raivoso do vizinho. O diretor Marc Forster (“Por Trás dos Seus Olhos”, “O Caçador de Pipas”, “Mais Estranho que a Ficção”) utiliza com maestria o velho recurso de flashback para mostrar ao espectador a história de Otto, Sonya e outros vizinhos de tantas décadas.

Adaptado do livro “Um Homem Chamado Ove”, de Frederik Backman, o filme leva ao riso e às lágrimas, apresenta diferentes abordagens sobre perdas, preconceitos, sentimentos expostos e guardados. Fala de solidariedade, num mundo em que sequer olhamos nosso vizinho no elevador, pois as pessoas entram e saem olhando apenas para a tela do celular. Em exibição nas várias salas de cinema da cidade (mas eu optei pelo Cinemark do Colinas Shopping, pois não abro mão de sessões com filme legendado). Programe-se e leve a família!

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Séries

‘Desserviço ao Consumidor’

Lançado em 2019, mas com uma singela divulgação, a série documental Broken (título original) está disponível na Netflix e com apenas quatro episódios apresenta denúncias e graves alertas ao consumidor. “Mundo dos Cosméticos”, “Febre do Vape”, “Móveis Mortais” e “A Farsa da Reciclagem” expõem os riscos à saúde e ao planeta, sob o pano de um consumo a cada dia mais insano.

Os números saltam aos olhos: num Brasil de abismos sociais, somos o quarto mercado mundial de beleza, com um faturamento de quase US$ 30 bilhões em 2019, segundo a revista “Capital Econômico”. Nesse que é um dos setores econômicos que mais crescem no mundo, pululam campanhas publicitárias protagonizadas por celebridades, além de influencers de maquiagem nas redes sociais, todas apresentando fórmulas mágicas de beleza que instigam o consumo às mais diferentes gerações de mulheres –mas não apenas.

“Desserviço ao Consumidor” nos mostra em seu primeiro episódio o crescente (e assustador) submundo da falsificação de produtos, marcas e embalagens, oriundos de laboratórios clandestinos em diferentes países. Aqui inexiste regulamentação sanitária e qualquer cuidado com a higiene: apreensões levadas a teste revelaram em suas fórmulas traços de urina, fezes, pelo de animais, metais pesados, bactérias e componentes cancerígenos. Entretanto, sedentas pela posse do gloss das famosas, por exemplo, as consumidoras não demonstram preocupação ao adquirir uma versão falsificada do produto, desde que esse preço caiba no seu bolso.

As consequências, porém, assustam: numa das entrevistas, há o relato de uma adolescente que teve os lábios grudados após o uso de um batom; levado a teste laboratorial, foi constatada a presença de uma cola proibida para uso em fórmula cosmética! Constata-se, enfim, que a soma de material de baixíssima qualidade, trabalhadores mal pagos, infraestrutura de “fundo de quintal” e fuga de tributos resulta nessa indústria que alimenta o ávido mercado de cosméticos falsificados, amplamente divulgados em conhecidos sites de venda.

O assunto incomodou você? Ótimo sinal! Então sugiro que reúna a família para ver a série e refletirem juntos sobre isso.

> Trailer

A série trata de abusos aos direitos do consumidor e critica o consumismo exagerado. Foto / Divulgação

> Tila Pinski é jornalista (MTb 13.418/SP), redatora e revisora de textos, coordenadora editorial e roteirista. Cinéfila, reside há dez anos na Vila Ema.

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