Ferreira Gullar
Pode acontecer que
enquanto ris
com os amigos no bar
cheio de confiança, de certeza,
a vida te prepare uma surpresa
silenciosamente, lentamente
como as nuvens que rolam pelo ar
*
Poderás dar com ela numa esquina
talvez quem sabe dentro de um cinema
talvez quem sabe num telefonema
*
E de repente nada tem sentido:
é amargo o chope, o papo aborrecido,
a alegria dos outros uma injúria.
*
A vida em suma
é apenas som e fúria
não significando coisa alguma.
*
Pra que viver então? tu te perguntas,
se a vida é sem sentido e sem razão?
E eu te respondo: é certo,
a vida não tem sentido mesmo não,
*
O sentido da vida a gente inventa
misturando a mentira com a verdade
do mesmo modo como a nuvem inventa
a sua dança branca, branca e lenta,
sobre a nossa cidade
Ferreira Gullar nasceu em 1930, em São Luís (Maranhão) e morreu em 2016 no Rio de Janeiro, já festejado como um dos maiores poetas brasileiros e em língua portuguesa. Se nome era José Ribamar Ferreira. Foi membro da ABL (Associação Brasileira de Letras).
> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.