Ingeborg Bachmann
Vêm aí dias piores.
O tempo adiado até nova ordem
surge no horizonte.
Em breve deves amarrar os sapatos
e espantar os cães para os charcos.
Pois as vísceras dos peixes
esfriaram no vento.
A luz da anileira arde pobremente.
Teu olhar pressente a penumbra:
o tempo adiado até nova ordem
desponta no horizonte.
Do outro lado afunda tua amada na areia,
ele sobe-lhe pelo cabelo esvoaçante,
ele corta-lhe a palavra,
ele ordena-lhe silêncio,
ele encontra-a mortal
e pronta para a despedida
depois de cada abraço.
Não olha para trás.
Amarra teus sapatos.
Espanta os cães.
Joga os peixes ao mar.
Anula a anileira!
Vêm aí dias piores.
Ingeborg Bachmann foi escritora, dramaturga e poeta. Nasceu em 25 de junho de 1926, em Klagenfurt (Áustria) e morreu em 17 de outubro de 1973, em Roma (Itália). Como muitos escritores de língua germânica do pós-guerra, ela começou sua carreira de poeta no Grupo 47, movimento poético de vanguarda na República Federal Alemã, que revelaria nomes como o de Günter Grass e dominaria as letras germânicas desde sua fundação em 1947 até sua dissolução em 1966. Como os integrantes do grupo, Ingeborg buscava uma renovação na linguagem. Sua poesia, elegante, mas com tons sombrios, mostra influência da Antiguidade clássica, do surrealismo e de escritores como Klopstock e Rainer Maria Rilke.
> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.