Foto / Maria D'Arc Hoyer

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

“Onde não tiver amor não te demores”, apregoa a frase grafitada na pista de skate, em uma parte escondidinha entre árvores, no fim de uma rua sem saída, em um bairro bem periférico de São José dos Campos.

A filosofia estampada no concreto faz uso da licença poética. O original seria: “onde não puderes amar, não te demores”.

Ao lado do fragmento de texto, uma imagem meio estilizada de Frida Kahlo, em referência ao senso comum da cultura da internet de que essa frase é da artista mexicana. Uma busca no Google indica que, na verdade, ela teria sido dita pela atriz italiana Eleonora Duse, falecida em 1924.

Aos 14 anos, Eleonora interpretou Julieta no teatro. Teria entrado no meio teatral desde os quatro anos de idade, pois a família era do ramo. Passou por muitas dificuldades quando criança e adolescente, mas não desanimou e chegou a ter sua própria companhia teatral.

Quando Eleonora morreu, aos 65 anos, Frida Kahlo já tinha 17 e, considerando a atitude revolucionária que tinha, poderia sem dúvida ter cunhado a frase de incentivo à autoestima.

Se Frida e Eleonora compartilhavam essa ideia de valorizar a si mesmo, com certeza não devem estar discutindo entre si os direitos autorais da frase lá na eternidade.

Mas devem estar satisfeitas com a propagação do princípio do amor próprio. Ainda mais assim, grafitada ao relento, ao alcance de qualquer um. Poesia grátis, do tipo que sacode os acomodados. É bom demais.

Melhor ainda imaginar que, pelos traços e escolha do canal e da arte, é um coração adolescente que pensa sobre isso. Está atento ao fato de que é importante amar e ser amado com verdade.

Passo com frequência por esse local durante minhas caminhadas matinais e, vez por outra, me pego imaginando se algum par de amigos ou namorados já esteve ali, sentado na cabeceira da mini rampa de skate, com as pernas balançando à frente das sobrancelhas espessas de Frida, enquanto discutiam o significado da frase.

Essa certamente é a glória para qualquer poeta, de carreira ou eventual; saber que a ideia fecundada em sua cabeça corre solta por aí, educando os corações.

 

> Maria D’Arc Hoyer é jornalista (MTb nº 23.310) há 28 anos, pós-graduada em Comunicação Empresarial. Mora na região sudeste de São José dos Campos. É autora do blog recortesurbanos.com.br.