–– Alguém anotou a placa?
O colunista de Política do SuperBairro ficou estatelado no chão depois que o prefeito e o vice-prefeito da cidade passaram por cima da sua análise e seguiram viagem rumo aos seus ambiciosos projetos.
Foi na segunda-feira, final de tarde. Começou um zum-zum na cidade como se algo de excepcional estivesse para acontecer. Será um ciclone, um furacão, um terremoto? Uma invasão de Óvnis? O que se sabe é que, até a tarde desta terça-feira o jornalista não fala coisa com coisa, chama urubu de meu louro, confunde Jesus com Genésio.
O colunista estava tranquilo até o início da tarde da segunda-feira, com a sensação do dever cumprido. Publicou a coluna Política & Políticos apostando em uma saída do prefeito Felicio Ramuth do PSDB para uma carreira solo no PSD. Alguns companheiros o seguiriam, nada expressivo. E o vice-prefeito Anderson Farias ficaria no seu posto, no seu PSDB, para “tomar conta do lodjinha”.
Mal sabia ele que os deuses do “achismo” iriam se vingar terrivelmente. Quando o burburinho começou, teve início também uma tremedeira no corpo do jornalista. Covid? Síndrome gripal? Piriri? Nada disso. Era a tremedeira provocada pelo choque com a realidade.
Acelerando a história, o prefeito saiu mesmo do velho ninho tucano, mas em vez de carreira solo engatou uma dupla sertaneja superafinada, levando com ele o vice-prefeito, que dentro de poucos meses poderá ser o prefeito de São José dos Campos até 2024.
Se alguém se queixava de falta de emoções na política joseense, pode mudar de ideia. Foi uma reviravolta dos diabos. Um partido ainda inexpressivo, o PSD, passa a ter o prefeito e o vice-prefeito de uma das principais cidades do país; um orgulhoso PSDB, com quase 20 anos de poder na cidade, passa a ser coadjuvante; até o PT local deve estar procurando o seu eixo para saber a quem combater a partir de agora.
O que mais chama a atenção é que essa operação envolveu talvez toda a base aliada do governo municipal, ou seja, no mínimo uns 100 quadros e militantes estavam sabendo de tudo –ou quase tudo– e ninguém vazou nada. Isso não se faz com a imprensa…
O “grupo” não muda
Tudo isto está acontecendo para cumprir o projeto político de Felicio Ramuth e do grupo que ele representa, que sonha com lugares mais altos na política estadual e, quem sabe, nacional.
Segundo o chefão do PSD, o ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro Gilberto Kassab, a ideia é pensar em Felicio como candidato a governador do estado. É claro que uma composição como candidato a vice em uma chapa mais forte também não seria mau negócio. Outras possibilidades também existem. O fato é que Felicio está no jogo.
Não é inédito
Mas “senta que lá vem história…” Para quem não sabe, renúncia de prefeito –que pode ser o próximo passo de Felicio– para disputar outras eleições não é fato inédito em São José. Já aconteceu pelo menos três vezes.
Em 1982, o então prefeito Joaquim Bevilacqua, jovem deputado federal eleito pelo MDB em 1974 e, em 78, vencedor de goleada na eleição municipal que restituiu a autonomia política de São José, mudou de partido, foi para o PDS do então governador Paulo Maluf, e renunciou confiando em uma candidatura para o Senado, que acabou não acontecendo.
Bevilacqua iria ser seduzido mais uma vez pelo canto de sereia da política quando, eleito prefeito, agora em 1988, renunciou novamente, em 89 ou 90, para seguir o plano de ser candidato a vice-governador do estado na chapa de ninguém menos que Silvio Santos. Tudo isso por um inexpressivo partido chamado PST. Mas Silvio desistiu e deixou Bevilacqua falando sozinho.
Poucos anos antes, o mesmo enredo envolveu o então prefeito Robson Marinho, do MDB, que já havia sido presidente da Assembleia Legislativa. Ele sentiu-se atraído a disputar um mandato de deputado federal na eleição de 1986, que ao mesmo tempo estaria formando a Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição de 1988. Renunciou ao mandato de prefeito, foi eleito, participou da Constituinte, mas sua carreira nunca mais foi a mesma, a ponto de receber uma votação humilhante para deputado federal em 1990.
A História se repete?
São José e o Vale do Paraíba não merecem que a História se repita. É importante que a cidade e a região tenham maior representatividade em nível estadual e federal. Que sejam eleitos bons nomes, da situação, da oposição, da esquerda, da direita, do centro. Gestão se faz com dinheiro e o dinheiro está nos cofres do estado e da União, é preciso ter acesso às chaves.
Caso tudo dê certo, o prefeito Felicio Ramuth renuncia ao seu mandato até o próximo dia 2 de abril, deixando o vice Anderson Farias no cargo até o final do mandato. Aliás, até seis meses antes da eleição de 2024, quando ele sairia para ser candidato à reeleição. Se algo der errado, Felicio não renuncia e conclui seu mandato, só que fora do ninho tucano. Se renunciar, não tem volta.
Por enquanto, fica aqui o registro de uma segunda e uma terça-feira como há muito tempo não se vivia na política joseense. E fica o colunista de Política do SuperBairro ainda em recuperação do atropelamento que sofreu…
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.