− Pamonha, pamonha, pamonha de Piracicaba.
Assim anunciava em alto e bom som o veículo de venda de pamonha. Quem já não ouviu isso?
Escutei outro dia e me fez refletir. Nós guardamos em nossa memória um patrimônio de agradáveis sensações que experimentamos ao longo da vida, lamentavelmente junto ao entulho de más lembranças. Alguns recordam mais, outros menos, depende da idade e da evocação, que é uma maneira de fixar. Reviver bons momentos, descobri, é muito difícil, você mudou, as coisas mudaram. Não se repetem com as mesmas cores.
Esclareço que, além dos fatos da nossa vida, desde a infância, nos lembramos de muito mais coisa, existem memórias visuais, auditivas e olfativas. Um perfume ou um cheiro qualquer nos remete ao passado; uma imagem, muitas vezes não sabemos como, parece nos mostrar algo já vivido, uma música nos transporta numa virtual viagem ao passado.
Mas hoje fico nas memórias gustativas. Outro dia me lembrei de que fazia tempo que não comia uma pamonha, mas daquelas feitas em casa. Tia Filoca, rabugenta, vociferou:
− Que pamonha, que nada, homem! Pra você é fácil, fica de fora do preparo do doce, só aguardando para comer. Quero ver você lidar com o milho verde, para abrir a espiga, ralar, passar na peneira, pôr no fogo, isto e aquilo, aquela sujeirada, trabalheira insana. Não vejo nenhuma mulher hoje disposta a fazer isso. Não adianta você ficar com essas lembranças!
Não liguei muito. É o jeito dela, o que passou, passou, não tenho remorso pela minha condição masculina, que não dependeu de mim, mas das circunstâncias. Hoje tudo mudou.
Na verdade, me vêm à lembrança os sabores da infância. Aqueles mais maduros, lembram-se do quebra-queixo que o ambulante vendia no tabuleiro? Um doce na base de coco. Não comi mais, tudo de bom. E o biju, o algodão doce? Também havia aqueles pirulitos em forma de guarda-chuva, chupetinhas, hoje não provaria mais, bem mixurucas.
Além desses, que vinham pelo ambulante, havia os doces da venda, mercearias e armazéns, pois não havia supermercados. Você ia a esses locais, olhava para o balcão e escolhia o docinho, fosse uma maria-mole, um doce de abóbora, uma paçoquinha, às vezes um chiclete.
Minha avó Sinhá, bem sinhazinha, daquelas que aprendiam boas maneiras, tocar piano e fazer alguns quitutes, cozinhava uns biscoitos divinos, como os de sequilho. Um, de cerveja, era fantástico, infelizmente não comi nem vi mais em lugar nenhum.
Fuçando bem longe no tempo, que saudades do sujeito que passava com um carrinho, toda semana, em São Paulo, vendendo tremoços. Tremoço, hoje, você acha nos supermercados. Não sabe o que é? Veja no dicionário e procure se lembrar também dos seus sabores esquecidos na poeira do tempo.
> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.