Fachada da Faculdade de Direito de São José dos Campos na década de 1960. Foto / Pinterest/Álbum de Carlos Candido

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

– Mas que raio de petição é essa escrita em papel de embrulhar pão? Veja que absurdo, excelência!

O cartorário estava perplexo e foi mostrar ao juiz o requerimento –para ele desaforado– naquele ano de 1964. Era em São José dos Campos –como dizia o poeta Cassiano Ricardo–, mas não era poesia e sim um habeas corpus impetrado pelo culto advogado Altino Bondesan, que, além de causídico, era jornalista, professor, historiador e bom literato. O magistrado era o simpático Eduardo de Campos Maia Neto, o fórum aquele prédio padrão de 1940, na Praça Afonso Pena.

Olhou o juiz o suposto desacato em forma de requerimento trazido pelo escrevente, uma petição naquele papel vermelho, comum no comércio, para embrulhar mercadorias. Franziu o sobrolho, mas encerrou a conversa em pouco tempo: ─ É um habeas corpus, o chamado remédio heroico, que qualquer pessoa pode impetrar, nem precisa ser advogado, em qualquer papel ou por qualquer meio. Isto porque está na Constituição, trata-se da liberdade da pessoa, direito fundamental, sendo urgente e não vejo erro técnico nisso, processe regularmente.

O cartorário ficou aturdido, sem muito convencimento, mas o juiz era o juiz, nada mais falou nem lhe foi perguntado.

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Dos veteranos advogados em São José dos Campos, tínhamos o Sebastião Henrique da Cunha Pontes, o Tito Marcondes, Onadir Marcondes e o Costanzo De Finis Neto. Muito requisitados o Luiz Fernando de Almeida e seu irmão Lauro de Almeida, além do jovem político José Marcondes Pereira. Este, aliás, compunha a turma inaugural da Faculdade de Direito do Vale do Paraíba, primeira do interior, conseguida graças a esforços, dentre outros, de Jamil Mattar de Oliveira.

Nessa turma, formaram-se em 1959, ao que me lembro, o referido Altino Bondesan, Tito Liberato, Nagib Simão, Amin Simão, Ivete, Sílvio Bindão, José Maria da Silva, Sérgio Fleury (sim, aquele delegado), Edevaldo Alves da Silva, da FMU, e um dos próprios criadores da Faculdade, o professor Domingos de Macedo Custódio.

Brilhava no foro o Sérgio Santos, seguido de Alberto Roman, Tarcísio Soares, Salim Saab, José Lencione, Petinatti, Fernando Delgado de Almeida. Ligados à política, Francisco de Faria e Getúlio Orlando Veneziani, além do Marcondes. Com este, trabalhou Décio Mendes Pereira, que ingressou na magistratura, chegando a desembargador do TJ.

Já na Prefeitura, chefiados pelo antigo causídico Genaro Tavares Guerreiro, Luiz Eduardo Pereira Rodrigues e Bráulio Novaes de Castro. No CTA (DCTA), José de Castro Pimentel e João Stockler Maia. Na Câmara Municipal, o José Rubens e o Aníbal Almeida. Merece referência: na Municipalidade havia sido procurador em priscas eras o provisionado Mário Sampaio Martins, algo como um advogado prático.

Na década de 1930, e depois voltando em 1977, aposentado na magistratura, o ilustre e benemérito Pedro Barbosa Pereira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, advogando até os noventa e oito anos de idade. Em contraste, jovens causídicos logo despontaram na ocasião, como Délvio Bufullin, anos depois desembargador do Tribunal Regional do Trabalho; José Adélcio de Araújo Ribeiro, culto advogado, foi procurador do estado, trabalhando com o já veterano Milton Banhara. Antigo ainda era o professor Neif de Oliveira Mattar, formado na velha academia da USP, assim como o professor Moacyr de Souza. Advogava também o conhecido jornalista Álvaro Gonçalves.

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Juízes, além de Campos Maia, na sequência os excelentes Alberto Gentil de Almeida Pedroso Filho, Geraldo Carlos de Almeida Camargo e Fernando Febeliano da Costa Neto. Promotores de justiça, Antônio de Faria Rosa, depois secretário jurídico da Prefeitura, Benedito de Quadros, Lercy Brandão Branco dos Santos, Luiz Máximo e Antônio Eras. Sem deixar de mencionar o provecto Tertuliano Delfim Junior, o Tuta, além do notório Luiz de Azevedo Castro, um dos criadores da Faculdade de Direito.

Cartorários naquele 1964, cabe lembrar-se de Donato Mascarenhas, no cartório do registro de imóveis, tendo como auxiliar o incansável Bequinha.  No primeiro ofício, Felisbino Franco Rodrigues, com os conhecidos escreventes Ulisses Bueno de Miranda, José Benedito de Toledo, Cid Morel, Jorge Zamproni e auxiliar um menino, depois escrivão-diretor e hoje advogado: Ivan de Oliveira Costa. Com eles trabalhou outro estudante, este de direito: José Luiz Fourniol Rebello, depois procurador do estado. No segundo ofício, o Gonçalves, que tinha na escrivania do fórum Dary Baptista dos Reis, hoje tabelião, bem como o escrevente Iwao Kikko, anos depois procurador judicial e secretário de negócios jurídicos da Prefeitura. Havia o José Eras e o Bica, no distribuidor. Oficiais de justiça, o Tomé, o Toledinho, o Joãozinho Fernandes, entre outros.

Conta-se que o vetusto professor Luiz de Azevedo Castro, cujo falar de largos gestos e pronúncia característica dos embates do júri, dava ensejo a inúmeros imitadores, entre eles um posterior advogado da comarca.  O professor sempre repetia uma frase conceitual: ─ Soberania é o direito incontrastável de querer coercitivamente e de fixar as competências.

Ai de quem não a decorasse. Não é que aquele estudante, conhecido gozador, estava a imitar o mestre e não percebeu sua entrada em sala, sendo flagrado no deboche. Dizem que levou cinco anos para se formar, pois não passava em direito constitucional!

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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