Foto / Bolinhos Ôcaipira/Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

− Ei, amigo Zé, vamos comer o bolinho caipira lá no Asilo Santo Antônio? O de São José é o melhor do Vale do Paraíba!

Interceptado por velho conhecido em pleno calçadão da Rua Sete de Setembro, respondi brevemente, já antecipando a polêmica sobre o famoso bolinho caipira do Vale do Paraíba. O melhor é de Jacareí, onde supostamente foi inventado? Ou de Taubaté, antigo centro regional? Ou ainda de Caçapava? São José inteira acha que é o seu. Disse que preferia o daqui, joseense postiço que sou, mas oficial.

No entanto, a discussão está aberta. Qual é o melhor bolinho dito caipira?  O leitor decide.

Essa iguaria, o bolinho de milho, até mesmo de mandioca, é muito antiga. Os indígenas já faziam e assavam na fogueira. Jacareí reclama a primazia, em 1920 fazia lá o seu bolinho, mas não tinha esse nome.

Esse bolinho caipira da cidade vizinha, a nossa Atenas do Vale, chamava-se bolinho-peixinho, o recheio era um peixe pequeno, tipo lambari. Usavam farinha de milho, branca, em flocos. Mais tarde, com a disponibilidade maior de carne bovina, passou a ser feito também de carne e, por fim, a linguiça, estabilizando. Segundo eles, a tradição se disseminou pelo Vale do Paraíba.

Em São José dos Campos se tem notícia, a partir de 1927, do petisco denominado bolinho da Semana Santa, de farinha de milho amarela, recheio de carne moída, colocada crua e cozida dentro do próprio bolinho quando frito no óleo quente. A pesquisadora Ângela Savastano revelou que esse bolinho joseense era oriundo da vigília ou velório de Jesus morto, na sexta-feira santa, na chamada Guarda do Senhor Morto.

Já em Taubaté, dizem que é feito de farinha de mandioca e a cidade reclama –como em tudo– ter sido a origem da tradição, embora essa iguaria seja popular e, justamente por isso, tenha sofrido discriminação.

Não se pode esquecer da também vizinha Caçapava, cujo bolinho caipira já vem com o recheio na própria massa, igualmente defendido pela cidade como o número um.

Atualmente, bolinhos até veganos surgiram, inclusive de frango, estando, pois, ainda mais aberta a disputa.

Prefiro, repito, o de São José, sobretudo aquele que era feito usando a farinha de milho branca, de melhor qualidade, com pitada de farinha de mandioca, formato de pião de duas pontas. uma delícia, receita esquecida, por um tempo lembrado em casa.

Há quem não goste, diga-se, desse bolinho. Acredite. E na realidade ele precisa ser ingerido ainda quente, pelando a boca. Frio, como dizia um amigo desaforado, vira lavagem de porco. Não diria isso, mas ele perde a crocância.

Nos dias que seguem, mesmo em São José, há uma disputa interna entre o bolinho caipira do Asilo Santo Antônio, herdeiro antigo das festas do padre João, como o do Arraiá dos Vicentinos, a quermesse da Catedral de São Dimas, aquela da Praça da Capela Nossa Senhora de Fátima, o concorrido bolinho da Igreja da Sagrada Família, da Vila Ema, da Paróquia São João Batista do Jardim das Indústrias, enfim, muitos outros locais.

Quem sempre é do contra é a irascível tia Filoca, que disparou:

− Neste ano eu não gostei não desse bolinho caipira! Queimei minha boca num bolinho maçudo, sem formato, parecia um desses roliços de bar, sem gosto, parece que perderam a receita. Ou acho que as velhinhas boas de mão já bateram as botas, foram ao encontro do Criador!

Calma, tia, a senhora deu azar, o bolinho continua bom, era só o início…

 

> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.

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