Os temas para uma crônica são como gnomos brincando de esconde-esconde por entre arbustos. Se não curte gnomos, pense que eles são como pássaros saltitando galhos e fugindo entre as folhas, enquanto tentamos, em vão, observá-los. Ô bichinhos difíceis.
São assim, escorregadios, os temas, debochando da busca dos escritores. Vão e vêm pela mente, durante o banho, uma garfada que se leva à boca, o recebimento do troco no mercado. E se você não os anota, é um segundo e… já era, partem sem deixar memória.
Quando o prazo de publicação do texto vai chegando, a mente fica alerta e pensando em segundo plano sobre o que deve ser pinçado para a reflexão, em meio a tantas notícias e acontecimentos. O que vale a pena ser batucado no teclado do computador?
Os últimos tempos têm sido mesmo fartos de notícias. Se não for impressão apenas minha, o mundo parece em ebulição. Ebulindo tragédias e ameaças de guerra. Pobres seres humanos…
Por tudo isso, esta semana não queria ser eu a falar mais ainda sobre tristeza. Não se trata de ignorar a desolação de tanta gente sofrendo, em nosso país, com a catástrofe que atingiu Petrópolis. Ajudar é essencial nessas horas. Faça um pix para a entidade certa. Ajude a enviar roupas e alimentos. Se não puder ajudar com nada físico, faça uma prece. Mas também respire, para não correr o risco de sucumbir à tristeza.
E pensando assim, acabei apegada a um tema mais leve, que me abordou com jeitinho, entre uma linha e outra do livro que me ajudava a buscar o sono. Vamos a ele.
Eu ganhei uma goiaba há poucos dias, de uma amiga, durante o trabalho. Uma amiga dada a mineirices, até porque é mineira mesmo rs…, e de casa de mineiro e de nordestino não se sai sem degustar algum quitute. Não visite um deles enquanto faz dieta; não rola.
Parece que a prosa não avança se não for diante de um “cafezim”, um bolinho, biscoitinhos, uma cumbuca de sorvete. E me perdoem os fits da vida, mas comida é coisa que conforta.
E nesse dia, há pouco tempo, foi assim. Passei na casa dela para uma rápida reunião de trabalho. Durante esse curto tempo recusei todas as ofertas de quitutes, sucos e aceitei apenas água. Em minha defesa, já era quase hora do almoço.
Mas de saída, inconformada, penso eu, com minha falta de apetite, ela ofereceu: — Quer uma goiaba? Colhi hoje aqui do quintal. Estão enormes.
Como recusar? Até porque é uma das minhas frutas preferidas. Aceitei feliz o mimo e levei para o lanche de mais tarde. Só que não deu tempo de lanchar. A fruta acabou vindo para casa e virou sobremesa à noite. Uma delícia. Feiinha por fora, mas doce e suculenta, como são as frutas que amadurecem no pé.
Foi quando me lembrei do período em que, eu recém-chegada da maternidade, filho pequeno no berço, noites sem dormir, visitas que não paravam de aparecer ou telefonar (e o telefone ainda era aquele fixo, que não dava pra colocar um fone de ouvido e seguir com as atividades), descabelada e com olheiras profundas, busquei um sorriso amarelo para receber a vizinha da frente que batia à porta, no meio da tarde. Tinha ido conhecer o pequenino.
O sorriso amarelo ficou muito sincero quando ela, meio sem graça, me estende uma travessa com um bolo quentinho e diz: — “Desculpa”, eu não tinha nada para trazer de presente e sei que nesses dias a gente não tem tempo pra fazer nada diferente pra comer.
Detalhe, ela já era mãe de quatro, então sabia das coisas.
Curioso que em meio a tantos presentes, cartões e agrados que ganhei no exaustivo período pós-parto, foi o bolo que acabara de sair do forno a ficar guardado na memória afetiva.
E foi assim, enquanto eu comia a goiaba e degustava o livro, que pensei: — T’aí, vou escrever sobre isso: a delícia de ganhar mimos comestíveis inesperados.
São gestos despretensiosos que alegram o dia da gente. Ok, eu sou do signo de touro e temos fama de glutões, mas você aí, de qualquer signo, concorda comigo ou prefere fazer dieta?
> Maria D’Arc é jornalista (MTb nº 23.310) há 28 anos, pós-graduada em Comunicação Empresarial. Mora na região sudeste de São José dos Campos. É autora do blog recortesurbanos.com.br.