Foto / Reprodução

Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

 Hilda Hilst

 

Se quiserem saber se pedi muito

Ou se nada pedi, nesta minha vida,

Saiba, senhor, que sempre me perdi

Na criança que fui, tão confundida.

À noite ouvia vozes e regressos.

A noite me falava sempre sempre

Do possível de fábulas. De fadas.

O mundo na varanda. Céu aberto.

Castanheiras douradas. Meu espanto

Diante das muitas falas, das risadas.

Eu era uma criança delirante.

Nem soube defender-me das palavras.

Nem soube dizer das aflições, da mágoa

De não saber dizer coisas amantes.

O que vivia em mim, sempre calava.

E não sou mais que a infância. Nem pretendo

Ser outra, comedida. Ah, se soubésseis!

Ter escolhido um mundo, este em que vivo,

Ter rituais e gestos e lembranças.

Viver secretamente. Em sigilo

Permanecer aquela, esquiva e dócil.

Querer deixar um testamento lírico

E escutar (apesar) entre as paredes

Um ruído inquietante de sorrisos

Uma boca de plumas, murmurante.

Nem sempre há de falar-vos um poeta.

E ainda que minha voz não seja ouvida

Um dentre vós, resguardará (por certo)

A criança que foi. Tão confundida.

 

Hilda de Almeida Prado Hilst, mais conhecida como Hilda Hilst, foi poeta, ficcionista, cronista e dramaturga. É considerada pela crítica especializada como uma das maiores escritoras em língua portuguesa do século 20. Nasceu em 21 de abril de 1930, em Jaú (SP), e morreu em 4 de fevereiro de 2004, em Campinas (SP). Fonte: Wikipédia

PUBLICIDADE

> Júlio Ottoboni é jornalista (MTb nº 22.118) desde 1985. Tem pós-graduação em jornalismo científico e atuou nos principais jornais e revistas do eixo São Paulo, Rio e Paraná. Nascido em São José dos Campos, estuda a obra e vida do poeta Cassiano Ricardo. É autor do livro “A Flauta Que Me Roubaram” e tem seus textos publicados em mais de uma dezena de livros, inclusive coletâneas internacionais.

PUBLICIDADE
PUBLICIDADE
PUBLICIDADE