Uma das brincadeiras mais comuns da minha infância e também dos meninos da minha geração era “bandido e mocinho”. Consistia em usarmos nossos revólveres, espingardas, cassetetes, espadas etc. para uma “guerra” entre a lei e o crime. Porém, a maior dificuldade da brincadeira era encontrar quem quisesse ser bandido.
Mais ou menos igual era, nas peladas das ruas e terrenos baldios, ter algum voluntário para ser goleiro. Todos queriam driblar, marcar gols, ser os heróis. Goleiro era função para os menos habilidosos ou os que tinham menos amigos no grupo.
O tempo foi passando, as pessoas foram desacreditando da classe política e dos bons empregos, abandonando o esforço por uma educação de qualidade, perdendo a crença de que o bem vence o mal.
Dezembro de 2021, próximo do Natal, regiões leste e sul de São José dos Campos. A exemplo do que já vem acontecendo na periferia da maioria das cidades do estado de São Paulo, aparecem faixas alertando aos bagunceiros que, com suas motos modificadas e mentes distorcidas, teimam em perturbar o sossego dos moradores, em sua grande maioria gente do bem que só quer paz e noites silenciosas.
Mas as faixas não fazem parte de nenhuma campanha educativa e não são de autoria de quem é responsável pelo cumprimento da lei e da ordem. Acredite, são organizações criminosas que resolveram decidir que os motoqueiros cometem crimes e devem ser punidos com “cacete” ou coisa pior.
Mas eles, que vivem do nojento comércio das drogas, dos homicídios, dos roubos e furtos e de todo tipo de violência e transgressão à lei, em sua visão cínica, não merecem punição.
Na cidade de São Paulo, um motoqueiro desrespeitou a “lei do crime” e foi filmado sendo brutalmente espancado, até que gravou mensagem aconselhando outros desavisados a cumprir as determinações dos criminosos.
Polícia ou bandido?
Voltando a São José dos Campos, a Polícia Militar reagiu e retirou as faixas que encontrou no Novo Horizonte e, se não me engano, no Campo dos Alemães. Você, cidadão que respeita as leis, irá dizer: “Que bom que a polícia agiu rapidamente”. Certo? Só que não. Veja algumas manifestações publicadas nas redes sociais sobre a retirada das faixas:
“Agora a polícia vai assumir que é autoridade no local. Não????”
“A polícia militar não dá conta, os chefões dão. Feio hein.”
“Recado já foi dado acata quem quiser quem não quiser sofre consequências infelizmente é assim #paz#”
“A polícia não tem respeito mesmo os patrão tem mais moral na quebrada que a polícia”
“Aq no galo Branco que precisa, tá uma zona já”
“Coitadinhos, os infratores sempre são protegidos, o povo que paga os impostos que se f…”
“A polícia tirou porque acha que manda mais que o cara da faixa kkkkkk, coitados”
Pois é, amigos. Gente que mostra a cara e assina essas barbaridades está simplesmente do lado do bandido e contra a polícia. Do lado do crime e contra a lei. Acredita nisso?
Qual é o seu lado?
Vamos pensar um pouco? O que é mais fácil? Cometer um crime e fugir ou, depois do crime cometido, investigar, deter, processar, condenar e levar o criminoso à prisão? Pois é esta a diferença entre a polícia e os bandidos. Apesar do policiamento preventivo que é feito por várias instituições públicas e até pelas empresas de segurança que procuram proteger o patrimônio das pessoas, cometer o crime é sempre mais fácil.
E fica mais fácil ainda quando gente de bem passa a aceitar o domínio das organizações criminosas em seus bairros e vilas. É gente que não colabora com as forças policiais com informações e denúncias… que quando vê um crime sendo cometido fica feliz por não ter sido com ela… que quando vê a polícia cumprindo a lei nas batidas em que revistam e pedem documentos, ou nos comandos de trânsito atrás de armas, pessoas embriagadas e outras irregularidades, em lugar de aplaudir a ação, usa aquela frase surrada: “em vez de prenderem os bandidos ficam atrapalhando a nossa vida”.
Se você pensa assim, desculpe dizer, mas você escolheu um lado, o lado do crime. É o lado errado. Você deve apoiar a polícia. Ela representa a sociedade organizada, o Estado de Direito, os cidadãos de bem. Este é o lado certo.
Alguns irão dizer que a polícia é violenta e corrupta. Não vou negar que ainda existem ações violentas e gente corrupta que diz trabalhar em nome da lei. Mas é preciso reconhecer que a cada dia que passa essas polícias estão trabalhando para se livrar de maus elementos que destoam da esmagadora maioria de gente honesta que zela pela nossa segurança.
Onde mora o perigo
Quase finalizando estas reflexões, quero alertar você para o grande perigo de achar que as polícias são frouxas e que deveriam combater os criminosos, custe o que custar. Já se cometeu esse engano no Brasil. E foi uma tragédia para todos os lados.
Os mais antigos irão se lembrar dos famigerados “esquadrões da morte” que agiam nas grandes cidades. Governantes despreparados fechavam os olhos para as atrocidades que aquela gente cometia porque achavam que ela estava limpando a cidade dos maus elementos.
Não estava. Quando a polícia age fora da lei ela transforma a si própria em uma espécie de organização criminosa. E a impunidade leva ao cometimento de cada vez mais crimes. Até que chega o momento em que uma polícia como essa lucra com os roubos, furtos e outros crimes contra o patrimônio, punindo quase sempre com a morte os bandidos que não seguem as suas ordens.
Estamos evoluindo. Hoje, além de terem extinguido essas quadrilhas que se escondiam sob o disfarce de agentes da lei, as polícias Militar, Civil e outras organizações de segurança pública cumprem regras muito rigorosas. Em caso de suspeita de abuso de autoridade ou descumprimento das leis, elas mantêm corregedorias para cortar na própria carne e livrar a maioria honesta da minoria desonesta dentro dessas instituições.
Vamos voltar à cena das faixas nas ruas. Para os integrantes de organizações criminosas é fácil fazer cumprir regras destinadas aos motoqueiros. Basta usar a violência, dar uma surra ou, quem sabe, eliminar o transgressor.
Imagine como seria fácil também para as polícias Militar e Civil, ou para a Guarda Civil Municipal garantirem o sossego nos bairros da cidade. Bastaria “descer o cacete”, surrar, destruir as motos, perseguir os motoqueiros até dentro de suas casas e, quem sabe, deixar alguns mortos nessa “brincadeira” e atribuí-los a “acidentes de trabalho”.
Percebeu onde uma parcela da população está querendo chegar? Ora essa, garantir sossego violando as leis é fácil, mas não é tão fácil conseguir o mesmo resultado sem descumprir as leis. E pior, com parte da população torcendo contra e tratando quem manda no crime organizado por “chefes” ou “patrões”.
Afinal, de que lado você está?
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.
> Texto atualizado às 16h17 do dia 28/12/2021 com revisão gramatical e de estilo.