Era conhecido como o terreno das vaquinhas, lá no Jardim Aquarius, na região oeste de São José dos Campos. Para quem tem o privilégio de ter a janela de trabalho ou de casa para aquela paisagem, ou apenas usa os elevadores panorâmicos de alguns prédios em frente ao local, a amplitude do espaço com as vaquinhas pastando proporcionava um momento de reflexão e tranquilidade.
Mas então, parafraseando a instigante música da banda Paralamas do Sucesso e Gilberto Gil, a novidade veio dar na avenida Cassiano Ricardo. Vaquinhas removidas, sabe-se-lá pra onde, tratores e arados prepararam a terra para o plantio de milho; mas uma faixa generosa de terra, nas bordas do terreno, foi decorada com uma plantação de girassóis.
Lembra da música? “A novidade veio dar na praia, na qualidade rara de sereia, metade o busto de uma deusa maia, metade um grande rabo de baleia…”
A guerra entre os observadores do local começou com a abertura das primeiras flores. Claro, uma batalha restrita às redes sociais, como costuma ser hoje em dia.
A cada foto ou vídeo postado, uma enxurrada de comentários variados, como: Deviam plantar comida. Por que não constroem casas populares? O terreno deveria ser aberto para as pessoas poderem tirar fotos. Os girassóis foram plantados para proteger o milho, que vai dar um bom dinheiro para o dono do terreno. A plantação foi feita para reduzir os impostos sobre o terreno.
Tem até comentários dizendo que as flores iam atrair abelhas e incomodar os moradores por perto. E por aí vai.
A essa altura, os girassóis são, principalmente, a motivação para debates sobre a função social da terra e a exposição das preocupações, medos e angústias da população. Reais ou imaginários. É interessante observar isso navegando pelos comentários, buscando entender o que move as pessoas. O que uma “simples” plantação de girassóis pode despertar.
Para ser justo, tem muita gente feliz com a novidade. Postando selfies, compartilhando voos rasantes de drones sobre a plantação dourada, elogiando a nova paisagem como cartão postal da cidade.
O que me leva de volta à música. Os girassóis são a guerra “entre o feliz poeta e o esfomeado”.
As notícias já dão conta de que existem estudos para a implantação de um loteamento ou condomínio no terreno que era das vaquinhas e agora é dos girassóis. Mas que, apesar de todo o debate, tem dono e ele pode dispor do local como achar melhor. Aos observadores cabe aproveitar o momento, que, por ora, é florido.
Não sei se o provável futuro empreendimento imobiliário a ser lançado no local terá o nome de Condomínio Girassol. Se for o caso, essa terá sido uma ação de marketing surpreendente e bela.
> Maria D’Arc é jornalista (MTb nº 23.310) há 28 anos, pós-graduada em Comunicação Empresarial. Mora na região sudeste de São José dos Campos. É autora do blog recortesurbanos.com.br.