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Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 45 anos. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

As pautas dos debates políticos no Brasil estão pendendo cada vez mais para o comportamento, os direitos individuais. Antes, os temas eram mais ligados aos direitos humanos, aos problemas sociais, enfim, ao que interessa diretamente aos mais humildes deste país.

Uma dessas pautas atuais é o direito à posse (compra) e ao porte (autorização de uso) de armas por qualquer cidadão, desde que tenha bons antecedentes, é claro. Imagine: é você tendo uma ou mais armas que pode levar no bolso da jaqueta, ter no porta-luvas do carro, ou manter em locais estratégicos da sua casa ou local de trabalho. Para quê? Para se defender dos criminosos, é claro.

Até aí, tudo ótimo. Quem pode ser contrário ao direito de alguém se defender do ataque de assaltantes, sequestradores, maníacos e outros que formam o que se costuma chamar de escória da sociedade? Eu adoraria ter um meio de defesa contra um ataque de gente desse tipo. Procuraria usar a minha arma para defender a mim e à minha família.

Quem defende o direito ao uso de armas por todos os cidadãos costuma dizer que o bandido, ao saber que você tem o direito legal de estar armado em sua casa, vai pensar mil vezes antes de entrar lá. Concordo.

Também vai dizer que cidadãos armados podem proteger os seus entes queridos nas mais variadas situações do dia a dia. Em uma padaria, você está com seus filhos, entra um assaltante armado e você pode sacar sua arma para afastá-lo. Ainda concordo, mas em termos.

O defensor das armas ainda irá argumentar que o direito do cidadão de se defender vem antes do dever do Estado de protegê-lo. Indo mais longe, vai dizer que você tem o direito de se proteger do próprio Estado, se for atacado por ele. Já não concordo.

Como você está percebendo, a questão do direito de propriedade e/ou de porte de armas é bastante complexa. Em alguns casos, seria um presente dos céus ter uma arma, em outros seria talvez uma temeridade. Não dá para generalizar, ainda mais no Brasil.

Eu gosto sempre de lembrar, muito infelizmente, uma frase do antropólogo e filósofo Claude Lévi-Strauss, que disse, no seu livro “Tristes Trópicos”, referindo-se a todo o continente americano, que ele estaria condenado a ir “da barbárie à decadência sem conhecer a civilização”. A frase, repito, referia-se à América, mas parece a cada dia mais apontada para o Brasil.

Quem poderia se armar? Esta é uma boa pergunta. Quem poderia ter direito de portar uma arma? Vai depender da profissão? Da renda? Da classe social? Dos antecedentes criminais? Da exposição aos perigos? Difícil, não? Em um país ainda muito desigual, a tendência seria o rico ou o cidadão de classe média poder ter uma arma e o pobre ficar desarmado ou ter que procurar uma arma clandestina.

Além disso, possuir uma arma é muito mais complexo que, por exemplo, ser dono de um carro. Se para dirigir um automóvel é preciso fazer muitas aulas de autoescola, prestar exame, ser aprovado e ficar ainda sob um período probatório, imagine para ter direito de se armar.

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No país das armas

A complexidade deste assunto me chamou atenção nestes dias ao acompanhar na imprensa nacional cinco casos de assassinatos em série nos Estados Unidos, país em que a compra, guarda e uso de armas é bastante liberalizada.

– No dia 24 de maio, um atirador de 18 anos de idade invadiu uma escola de ensino fundamental da cidade de Uvalde, no Texas, matando 21 pessoas, 19 crianças e dois adultos.

– Antes, no dia 14, um homem matou dez pessoas a tiros ao atacar em um supermercado na cidade de Buffalo, estado de Nova York.

– No dia 1º deste mês, um novo ataque a tiros, desta vez em um hospital de Tulsa, no estado de Oklahoma, deixou ao menos quatro mortos.

– No último sábado (4), na cidade de Filadélfia (Pensilvânia), três homens armados atiraram ao ar livre em uma rua movimentada deixando três mortos e 11 feridos.

– Domingo (5), em Chattanooga, cidade do Tennessee, mais três pessoas morreram e 14 ficaram feridas após tiroteio próximo a um bar.

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Como assim?

Você deve estar se fazendo a mesma pergunta que eu. Por que é que no país com os cidadãos mais bem armados do planeta acontecem tantas mortes causadas por atiradores com acesso às armas, mas os cidadãos de bem, que também podem ter o mesmo acesso às mesmas armas, não conseguem evitar tantas mortes?

Dou a você cinco minutos para pensar. Confesso que usei os meus cinco minutos e não consegui uma resposta para essa questão. Então vou tentar arriscar aqui um palpite: o agressor sempre vai levar vantagem contra o cidadão de bem. O primeiro já planejou todo o crime, o segundo nem desconfiou do que iria acontecer.

Este é um dos poucos artigos ou crônicas em que eu não vou assumir uma posição definitiva. Vou, antes disso, propor que todos nós pensemos um pouco mais nessa questão antes de uma conclusão.

Que mundo difícil este em que vivemos…

 

> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 46 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 20 anos.

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