Nós, cidadãos comuns, não somos gênios. Longe disso. A gente se esforça para acompanhar a evolução do mundo. Mas eu confesso que, quando se trata de entender os problemas e soluções para o Brasil, prefiro ficar na turma dos “esforçados” –a imensa maioria– do que fazer coro com esta nossa elite intelectual e financeira.
Dias atrás, o incensado economista Armínio Fraga, que presidiu o Banco Central entre 1999 e 2003, auxiliando a equipe econômica do governo a consolidar o Plano Real, deu a receita para a economia brasileira se recuperar da crise atual.
O economista defende o óbvio controle da inflação. Palmas para ele. Mas aí ele explica qual seria um dos principais truques para baixar a inflação: congelar o salário-mínimo durante os próximos seis anos. Entendeu? A culpa pela situação do país é de quem ganha salário!
Defensores do gênio –que parece sósia do poeta William Shakespeare– suavizam dizendo que não é bem um congelamento, é só não aprovar ganhos reais no mínimo, repondo apenas a inflação do período. A violência é igual. Com uma inflação de uns 3% ao ano, já imaginou a perda do poder de compra dos salários depois de seis anos?

Ah, mas depois desse sacrifício os pobres e remediados, os pequenos empresários, os modestos produtores rurais e toda esta gente que não faz parte da elite vai ter uma vida muito melhor, vai ter feito a sua parte. Você acredita nisso?
Enquanto isso, banqueiros, investidores no mercado financeiro, grandes grupos empresariais e o que os nordestinos humildes chamavam de “pudê” teriam seis anos de vida normal. Até porque parece que eles acham que não têm nada a ver com a crise.
E tem mais, cidadão. Além de ser culpado por ter um “salário inflacionário”, você vai continuar arcando com gente metendo a mão no seu bolso sem o menor pudor. No momento, o país convive com a exorbitante carga tributária de 32,3% do PIB, a maior dos últimos 15 anos. São esses impostos e contribuições que recheiam os cofres do governo federal, estados e municípios.
Além disso, é bom você não se esquecer da taxa Selic, aquela que norteia os juros praticados pelo mercado. Ela está em 14,25% ao ano, a maior em 20 anos, e o Galípolo –eles têm uns sobrenomes chiques, né?–, atual presidente do Banco Central, já disse que a facada vai continuar penetrando mais no nosso couro, ou seja, a Selic vai aumentar ainda mais.

Pelo que você viu até agora, a culpa da crise –e o preço a pagar por ela– é do brasileiro comum, ou seja, nós. Agora vamos dar uma olhadinha do outro lado da porteira, onde fica a elite e o governo obediente a ela. Caro leitor/leitora, convido você a dar uma olhada nas notícias da imprensa.
No governo federal, Executivo e Legislativo fazem um troca-troca em que um recebe votos para seus projetos e o outro ganha grana para transformar em emendas que eles dizem que não nos interessa saber para onde vão. Isto mesmo, elas são secretas.
No Judiciário, a cada notícia parece que nós vivemos no país mais rico –e esbanjador– do mundo. Juízes com salários altíssimos, gratificações malandras, vantagens inventadas e, sobretudo, impunidade. Como eles são o final da linha do poder, ninguém pode contestá-los. Só resta ao país enviar o dinheiro e ficar quietinho.
Com toda esta bagunça, a indústria, o agronegócio e o mercado financeiro, que deveriam ter do governo um misto de liberdade e vigilância, fazem o que bem entendem e se aproveitam de subsídios e outras vantagens porque, afinal, “quem não chora, não mama”.
Finalmente, retornemos a nós, pobres mortais. Somos os primeiros a pagar a conta de um país mal administrado, corrupto e voltado às elites. A ponto deste tal Armínio Fraga ter a coragem de propor um congelamento do salário-mínimo por seis anos.
Fica aqui uma perguntinha. E se a proposta dele fosse a de realmente taxar as grandes fortunas com impostos adequados? Ou excluir as emendas parlamentares por seis anos? Ou ainda eliminar os subsídios recebidos para o agronegócio durante seis anos? Nossa, iriam dizer que, com ideias como estas, além de culpados pela crise, nós assalariados e pequenos empreendedores somos um bando de comunistas. Aí, além de arrocho, é cadeia na certa.
> Wagner Matheus é jornalista (MTb nº 18.878) há 49 anos. É editor do SuperBairro. Mora na Vila Guaianazes há 24 anos.
