– Você já estudou para a segunda época? Pegou pelo menos no livro de matemática que comprei para você? Olha lá, tenho de fazer matrícula. A volta às aulas está logo aí, dois de fevereiro!
Assim eu ouvia minha mãe falar naquele distante início da década de 1960. Na realidade, eu não havia estudado nada, o livro de matemática era incompreensível. Bendito professor Osvaldo Sangiorgi. E, admita, difícil estudar matemática sem alguém explicando. Não havia a salvadora recuperação de hoje. Passou na prova de fim de janeiro, tudo bem, não passou, bomba! Não deu outra, fiquei de ano.
As aulas vão voltar, para as escolas do Estado, acho que em quinze de fevereiro, as da Prefeitura de São José dos Campos no dia sete. Ouvi que num colégio, dia vinte e nove, ainda em janeiro. Bom? Sim, agradável para os estudiosos, os antigos CDF, atualmente não sei o nome, nerds? Aqueles que no futuro vão ser seus chefes. Para outros, talvez a maioria, aborrecido voltar às salas, horários a cumprir, acordar cedo, celulares e jogos eletrônicos regulados, baladas mais curtas, professores chatos.
Este ano tem um Carnaval logo a se iniciar em nove de fevereiro, sexta-feira, primeiros desfiles, bailes de abertura. Quem volta às escolas antes já pega uma folga prolongada. Alguns simplesmente não dão as caras nas escolas, apoiados pelos pais. Outros, mais sérios e determinados, aproveitam para se reenturmar, organizar-se, já iniciar estudos antecipados, conhecer alguns professores e o ambiente. Os adeptos de Momo, contudo, vão se esbaldar antes. Caí na besteira de perguntar para jovem parente sobre a volta às aulas. Resposta: ‒ Ah, vou pensar nisso só depois do Carnaval.
Afinal, o Brasil começa seu ano, todo mundo sabe, só depois do Carnaval. No dia dezenove de fevereiro, uma segundona, já tudo terminou no reinado dos foliões –menos no Nordeste. Antes disso, no país inteiro, nada funciona. São recessos, férias, prazos suspensos, decisões parlamentares importantes deixadas para mais tarde. O mesmo no Judiciário, nada além do urgente. A Nação a passo de tartaruga! Afinal, ninguém é de ferro!
Mas preste atenção, as cobranças já estão correndo soltas neste janeirão: IPVA, IPTU, GPS, matrículas, impostos e contribuições e, se já não antecipados, mensalidades e material escolar. São boletos para todos os lados, sem contar os aumentos. Alguém recebeu aumento salarial em janeiro?
Você já viu alguma entidade −pública ou privada, aquela pessoa jurídica que ninguém identifica, não tem cara−, ao fazer qualquer alteração, pensar efetivamente nos outros? Ao criar arquivos digitais −atendimento automático ou toda providência destinada ao cidadão, ao consumidor, aos usuários− fazem isso no interesse destes? Nunca ou rarissimamente. O funcionário que lida com isso simplesmente bajula o empregador, facilita para ele. Os outros que se lasquem e penem para usar.
Tia Filoca já estrilou, bem ao seu estilo:
‒ Se eu pegasse pela frente os chefões dessas escolas, diretores de prefeitura, bancos, governos disto e daquilo, vendedores de alimentos, que aumentam tudo no começo do ano, iria moer esses pilantras de chineladas! Cada ano com um aumento ou um sistema novo e difícil, criado pra comedeira ou pra puxar o saco do patrão!
Respeitem o desabafo dessa idosa. Está certo que ela nunca vai encontrar nenhuma pessoa responsável, apenas funcionários, a maioria não se importa. Eu mesmo nunca conheci o Senhor Banco do Brasil. E chinelada não mata ninguém, tia. Pelo menos até hoje, mas sugiro que não provoquem esta rabugenta senhora.
> José Roberto Fourniol Rebello é formado em direito. Atuou como juiz em comarcas cíveis e criminais em várias comarcas do estado de São Paulo. Nascido em São Paulo, vive em São José dos Campos desde 1964, atualmente no Jardim Esplanada. Participou do movimento cultural nascido no município na década de 60.